domingo, 24 de janeiro de 2021

Mateus


O Evangelho de Mateus

A sucessão ao trono geralmente traz muitas incertezas e conflitos. Absalão, filho de Davi, tentou usurpar o trono de seu pai (2 Samuel 15.1; 18.18). Uma escolha errada feita pelo sucessor de Salomão, Roboão, ao trono fez com que este perdesse metade de seu reino para um traidor (1 Reis 12.20). Manaém assassinou seu predecessor em Israel (2 Reis 15.14). Ser rei era um negócio muito perigoso. E não foi diferente nem mesmo para o Rei dos reis, Herdeiro legítimo ao trono de Deus.

 Se já houve alguma vez uma sucessão tão conturbada, com certeza foi essa. Um homem [chamado Jesus] afirmou ser o Messias de Israel, e é claro que toda a nação quis tirar isso a limpo. E, obviamente, Ele teve de apresentar suas credenciais. Quem deseja ter em seu meio um impostor? Assim, o livro de Mateus aponta as credenciais de Jesus, apresentando-o como Rei, mas o Rei de um reino muito diferente — o Reino dos céus.

O Evangelho de Mateus tem muitas características judaicas. Por exemplo, o termo Reino dos céus aparece 31 vezes, e o termo Reino de Deus, cinco vezes. Nenhum outro Evangelho dá tanta ênfase ao Reino. A esperança da restauração do glorioso reino de Davi era algo que ardia no coração dos judeus naqueles dias. E Mateus nos mostra claramente que essa esperança estava em Jesus ao usar nove vezes em seu Evangelho o título da realeza judaica Filho de Davi. Além disso, Mateus chama Jerusalém de Cidade Santa (Mateus 4-5; 27.53) e a cidade do grande Rei (Mateus 5.35), duas formas exclusivamente judaicas de referir-se a ela.

Os judeus do primeiro século davam muita importância à justiça, e Mateus usa as palavras justo e justiça mais do que são usadas nos Evangelhos de Marcos, Lucas e João juntos. Mateus também trata de assuntos como a Lei, a pureza cerimonial, o Sábado, o templo, Davi, o Messias, o cumprimento das profecias do Antigo Testamento e Moisés — tudo isso de um ponto de vista judaico. Ele faz mais de 53 citações do Antigo Testamento e mais de 70 referências às Escrituras hebraicas.

Seu livro enfatiza 33 vezes que as obras de Jesus foram um cumprimento das profecias do Antigo Testamento. A genealogia no capítulo 1 é puramente judaica e descreve a descendência de Jesus de Abraão, o patriarca do povo judeu, até Davi. Além disso, Mateus menciona em seu Evangelho os governantes de Israel da época (Mateus 2.1,22; 14.1) e alguns costumes, como lavar as mãos (Mateus 15.2), sem explicá-los, indicando que seus leitores eram, em sua maioria, judeus já familiarizados com essas práticas. O Evangelho de Mateus vai muito além de apresentar uma mera biografia de Jesus. Um de seus objetivos é provar ao povo judeu que Jesus é o Messias, o Rei que havia sido prometido.

A genealogia no capítulo 1 aponta para Cristo como o herdeiro do Reino eterno que Deus prometeu a Davi. Ao citar um salmo messiânico, em Mateus 22.41-44, Jesus demonstrou de modo bem claro aos judeus que Ele é o Herdeiro do trono de Davi. Embora muitos judeus da época de Jesus fossem “cegos” demais para reconhecer quem Ele realmente era, os gentios (como os três sábios) reconheceram-no como o Rei prometido a Israel quando Ele era um bebê. Enfim, a acusação pregada na cruz acima da cabeça de Jesus destacava nitidamente Sua realeza: este é Jesus, o Rei dos judeus (Mateus 27.37).

No entanto, o mais importante no Evangelho de Mateus é que este documento prova a legítima autoridade de Jesus ao destacar Seus ensinamentos e Sua vida de retidão (Mateus 7.28,29). Outro objetivo do Evangelho de Mateus é descrever as características do Reino de Deus, tanto em relação a Israel quanto à Igreja. Os judeus ortodoxos sempre zombavam de todos os que afirmavam que Jesus era o Messias e ainda mais dos que declaravam que Ele era o seu Rei. Eles diziam: “Se Jesus é Rei, onde está a restauração do reino de Israel que foi prometida?” Muitos judeus nos dias de Jesus o rejeitaram como Messias, embora tanto Ele como João Batista tenham pregado que o Reino dos céus estava próximo (Mateus 3.2; 4.17; 10.7).

A rejeição de Jesus pelos judeus é o tema principal de Mateus (Mateus 11.12-24; 12.28-45; 21.33; 22.14). Por causa dessa rejeição, Deus adiou o cumprimento de Suas promessas a Israel e, por conseguinte, estendeu Suas bênçãos aos gentios. Mateus é o único dos Evangelhos que fala especificamente da Igreja (Mateus 16.18; 18.17), mostrando aos gentios como a Eclésia é formada e descrevendo vários episódios em que gentios demonstraram fé em Jesus: os magos, o centurião e a mulher cananeia.

Mateus deixou registradas a profecia de Jesus de que o evangelho seria pregado a todas as nações (Mateus 24.14) e a Grande Comissão, segundo a qual os apóstolos deveriam fazer discípulos em todas as nações (Mateus 28.19). O ensinamento de Jesus mostrava que as bênçãos do Reino de Deus seriam estendidas aos gentios. No entanto, um dia, Israel seria restaurado e receberia todas as bênçãos prometidas (Romanos 11.25-27; 15.8,9). O objetivo final de Mateus é instruir a Igreja. Uma pista muito clara disso está na Grande C o ­ missão, dada por Jesus: Ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Ensinando-as a guardar todas as coisas que eu vos tenha mandado (Mateus 28.19,20).

O processo de discipulado implica aprender e aplicar os ensinamentos de Jesus, e o Evangelho de Mateus enfatiza os principais discursos do Mestre, entre os quais: o Sermão do Monte (Mateus 5.1— 7.28); o comissionamento dos 12 apóstolos (Mateus 10.5— 11.1); a parábola do semeador, a do joio e do trigo, a do tesouro escondido e a da pérola de grande valor (Mateus 13.3-53); o maior no Reino dos céus, a importância do perdão, ilustrada pela parábola do credor incompassivo (Mateus 18.2— 19.1); o sermão profético sobre o fim dos tempos (Mateus 24.4— 26.1).

Em vez de empreender uma narrativa sobre a vida de Jesus, como faz Marcos, Mateus usa os 10 Mateus elementos da narrativa em seu Evangelho como pano de fundo dos sermões de Jesus. Este Evangelho não traz o nome de seu autor, mas deixa-nos pistas. Seu autor conhecia a geografia da Palestina muito bem (Mateus 2.1; 8.5; 20.29; 26.6). Ele estava familiarizado com a história dos judeus, seus costumes, suas ideias e as classes sociais (Mateus 1.18,19; 2.1; 14.1; 26.3; 27.2). Ele também conhecia muito bem o Antigo Testamento (Mateus 1.2-16,22,23; 2.6; 4-14-16; 12.17-21; 13.35; 21.4; 27.9). E a terminologia do livro sugere que seu autor era um judeu da Palestina (Mateus 2.20; 4.5; 5.35; 10.6; 15.24; 17.14-27; 18.17; 27.53).

 Os detalhes apontam de modo bem específico Mateus, o discípulo de Jesus, como o escritor desse Evangelho. Por ser coletor de impostos, Mateus era culto e entendia muito bem de contabilidade. Não é surpresa alguma, portanto, que este Evangelho contenha mais referências ao dinheiro do que todos os outros. Além disso, a cidade natal de Mateus era Cafarnaum, a qual, quando citada, vem sempre acompanhada de alguma explicação, como: cidade marítima, nos confins de Zebulom e Naftali (Mateus 4.13); que te ergues até aos céus (Mateus 11.23). Mateus escreveu seu Evangelho antes da destruição de Jerusalém em 70 d.C. Ele descreve Jerusalém em seu livro como a Cidade Santa, pois ela ainda estava intacta (Mateus 4.5; 27.53), e menciona os costumes judaicos que permaneciam até o dia de hoje (Mateus 27.8; 28.15). Além disso, a profecia de Jesus sobre a destruição de Jerusalém (descrita em Mateus 24.2) não traz indício algum de que já tinha sido cumprida quando Mateus registrou as palavras de Jesus. A luz de tudo isso, podemos concluir que o livro foi escrito entre 50 e 60 d.C.

 

Salmos


 

O Surpreendente Livro de Salmos

 

 Ariel Blumenthal

Os começos são importantes. Eles são fundamentais. Em Atos 2, o Espírito Santo foi derramado em Shavuot/ Pentecostes e a igreja nasceu. Ao longo dos próximos 2,5 capítulos, os discípulos (principalmente Pedro) proclamam o Evangelho, várias vezes, a todo o povo judeu reunido em Jerusalém. Como judeus que estavam pregando a judeus, eles precisavam construir o argumento de Yeshua ter o direito de ser chamado de Messias, citando e interpretando as Escrituras Hebraicas que continham profecias a seu respeito. Não havia um Novo Testamento para citar, apenas o “Velho” Testamento (VT, Tenach, Escrituras Hebraicas), e as palavras de Jesus que eles tinham ouvido diretamente dele.

Nessas primeiras proclamações do evangelho, contei nove citações diretas do VT. Surpreendentemente, seis delas – dois terços – são do Livro de Salmos. Não da Torá (os cinco livros de Moisés), e não dos chamados livros proféticos, mas dos Salmos, uma coleção de orações devocionais e canções de adoração a Deus.

Encontramos a mesma coisa no livro de Hebreus. Esta epístola contém cerca de 30-35 citações diretas do VT e, pelo que eu contei, 14 delas são citações de Salmos! Pense nisso: estamos tão acostumados a assumir a natureza fundamental da Torá e dos Profetas, e de fato são fundamentais mesmo. Mas quando se trata de proclamar o Evangelho e ensinar os primeiros crentes judeus, é o livro de Salmos que vem em primeiro lugar!

Pensar nos Salmos em uma terceira categoria de “apanhado geral” ou miscelânia dos “escritos” camufla todas as surpreendentes profecias messiânicas que podem ser encontradas neste livro – mais do que na Torá ou nos livros dos profetas como Isaías, Jeremias, etc. Yeshua, também, deu importância igual às três partes das Escrituras Hebraicas:

“A seguir, Jesus lhes disse: São estas as palavras que eu vos falei, estando ainda convosco: importava se cumprisse tudo o que de mim está escrito na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos” (Lucas 24.44, ênfase adicionada).

O que tudo isso pode nos ensinar? Em primeiro lugar, precisamos estudar todo o VT, igualmente e em sua totalidade, e não nos tornarmos excessivamente focados na Torá (primeiros cinco livros) como no Judaísmo e como em alguns movimentos de raízes judaicas. Em segundo lugar, ele aponta para a conexão orgânica entre louvor, adoração e profecia. A maioria dos Salmos citados pelos discípulos – e no livro de Hebreus – são canções de oração e adoração a Deus. No meio da oração e adoração, de repente, o salmista começa a profetizar, e muitas vezes Deus até fala por meio da voz e pela escrita do salmista em primeira pessoa! (Por exemplo, Salmos 16.8-11132.11-12110.1-4118.22-232.1-2; 2.745.6-78.4-622.295.7-1140.6-8 […]).

É uma fórmula simples: quando o povo de Deus – tanto individualmente quanto corporativamente – dedica seu coração a ele, canta e faz música para e sobre ele, então o fogo do Espírito Santo vem para “consumir” o sacrifício de louvor. As pessoas ficam cheias do Espírito e começam a profetizar as coisas que Deus revela com poder e “unção”. Essa fórmula era válida não apenas nos tempos bíblicos; é tão verdadeiro hoje como era naquele tempo. Todo cristão deve se dedicar a esses momentos regularmente – sozinho, em família e como congregações, casas de oração, etc. – e esperar que o Espírito Santo os encha de sonhos, visões, palavras, Escrituras, percepções, palavras de conhecimento, etc. Tudo isso é o espírito de profecia que testifica de nosso Senhor e Salvador, Yeshua, o Messias (Apocalipse 19.10).

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Elias

 

Corvo (Foto: Reprodução/Canva)

Elias foi alimentado por corvos

Cris Beloni

“Pergunte, porém, aos animais, e eles o ensinarão, ou às aves do céu, e elas lhe contarão; fale com a terra, e ela o instruirá, deixe que os peixes do mar o informem. Quem de todos eles ignora que a mão do Senhor fez isso? Em sua mão está a vida de cada criatura e o fôlego de toda a humanidade.” (Jó 12.7-10)

Reconhecendo que Deus é o Criador de tudo o que vemos ao nosso redor, podemos identificar em cada ser criado a Sua assinatura. Há sabedoria em todas as coisas e vestígios de uma mente inteligente em cada detalhe. Daremos início à série que vai analisar a inteligência presente nas aves do céu.

Vamos começar pelo corvo

“A palavra do Senhor veio a Elias: Saia daqui, vá para o leste e esconda-se perto do riacho de Querite, a leste do Jordão. Você beberá do riacho, e dei ordens aos corvos para o alimentarem lá.” (1 Reis 17.2-4)

“E ele fez o que o Senhor lhe tinha dito. Foi para o riacho de Querite, a leste do Jordão, e ficou por lá. Os corvos lhe traziam pão e carne de manhã e de tarde, e ele bebia água do riacho.” (1 Reis 17.5-6)

O que nos chama atenção nesse texto é o fato de um corvo alimentar um ser humano. Estamos diante de um texto literal ou simbólico? Vamos ao contexto:

Sabemos que os dois livros de reis narram a história nos tempos da monarquia em Israel. E, no texto que vamos estudar, veremos um profeta em conflito com o rei Acabe, por volta de 870 a.C.. Por conta desse conflito, Elias disse ao rei:

“Vive o Senhor Deus de Israel, perante cuja face estou, que nestes anos nem orvalho nem chuva haverá, senão segundo a minha palavra.” (1 Reis 17.1)

Essa profecia se cumpriu e a seca naquela região durou três anos. A fome afetou a todos, mas Deus providenciou socorro para algumas pessoas.  Vimos isso através do que aconteceu com Elias e com a viúva de Sarepta. Agora vamos analisar algumas questões.

Conflito entre o rei Acabe e o profeta Elias

O reinado de Acabe foi marcado por corrupção e apostasia. Veja o que diz a Palavra:

“E fez Acabe, filho de Onri, o que era mau aos olhos do Senhor, mais do que todos os que foram antes dele. E sucedeu que (como se fora pouco andar nos pecados de Jeroboão, filho de Nebate) ainda tomou por mulher a Jezabel, filha de Etbaal, rei dos sidônios; e foi e serviu a Baal, e o adorou. E levantou um altar a Baal, na casa de Baal que edificara em Samaria. Também Acabe fez um ídolo; de modo que Acabe fez muito mais para irritar ao Senhor Deus de Israel, do que todos os reis de Israel que foram antes dele.” (1 Reis 16.30-33)

Sendo assim, Deus envia Elias para o povo de Israel que estava vivendo nesse tempo de apostasia, crise social e espiritual, confusão política e fome extrema. O profeta confronta a idolatria do rei e é chamado de “perturbador de Israel” por causa disso.

Por que a profecia da seca?

Porque Baal era considerado o deus da fertilidade e senhor das chuvas e tempestades. Com a seca, os profetas invocaram a Baal gritando e se retalhando conforme o costume da época, mas nada aconteceu. E quando Elias clamou, Deus enviou fogo de forma milagrosa. Isso foi feito para que o povo pudesse diferenciar a verdadeira  da idolatria.

Antes de isso acontecer, Elias alertou o povo com as seguintes palavras: “Até quando coxeareis entre dois pensamentos? Se o Senhor é Deus, segui-o, e se Baal, segui-o.” (1 Reis 18.21)

A palavra “coxear” que quer dizer mancar ou andar com dificuldade, indica que o povo estava vacilando. Uma hora firmava o passo no caminho de Deus, outra hora firmava o passo no caminho da idolatria.

Milagres

Antes de entrar no contexto do corvo, lembre-se que outros milagres aconteceram na ocasião, por intermédio de Elias. A multiplicação do azeite e da farinha da viúva, a ressurreição de seu filho, Deus enviou fogo sobre a lenha molhada e um anjo alimentou Elias. Pensando em tudo isso, não há dificuldade de entender que Deus deu ordens a uma ave para alimentá-lo.

Lembrando também que “milagre” significa “ato ou acontecimento fora do comum”, ou seja, é inexplicável pelas leis naturais. Algo que deixa de ser ordinário (dentro da ordem esperada) para ser extraordinário. Não há muitas explicações racionais para o mundo espiritual. Mas vamos analisar as que existem.

Os corvos realmente alimentaram Elias?

Dentro do que estamos analisando, a resposta é sim. Muitos teólogos sérios seguem essa linha de pensamento. Outros, porém, defendem que houve um erro de transliteração e tradução da Bíblia, do hebraico para o grego (Septuaginta) – então, nesse caso, não é orevim (corvos) que alimentaram Elias e sim os Aravim (árabes).

Esse suposto erro alimenta o argumento de quem não consegue acreditar que Deus fez algo extraordinário. O outro argumento é que Deus não enviaria uma “ave imunda” (Lv 11.13-15Dt 14.14) para alimentar um judeu, conhecedor da Torah e suas leis.

A questão é…

Se considerarmos que houve mesmo esse erro e a palavra correta fosse traduzida por “árabes”, como ficaria então o texto de Gênesis?

“E aconteceu que ao cabo de quarenta dias, abriu Noé a janela da arca que tinha feito. E soltou um corvo, que saiu, indo e voltando, até que as águas se secaram de sobre a terra.” (Gênesis 8.6-7)

A palavra no hebraico é a mesma, então Noé teria soltado um árabe pela janela da arca? A única diferença na palavra, segundo o hebraísta Luiz Sayão, é que em Gênesis está escrito “corvo” (Orev) no singular e no livro de 1 Reis “corvos” (orevim) no plural.

Simbologias relacionadas ao corvo

Antigamente, povos pagãos encaravam o corvo como uma espécie de ave de mau agouro e de presságio da morte, por causa do seu grasnido lamentoso. Já nos dias de hoje, as pessoas não gostam de imaginar um corvo levando alimento para um profeta de Deus, porque essa ave foi associada ao mundo das trevas.

O cinema se encarregou disso. Só para citar alguns exemplos – Harry Potter e também o filme “O Corvo”, sucesso de bilheteria em 1994, onde o ator Brandon Lee, com apenas 28 anos de idade, morre na vida real durante as filmagens.

No enredo do filme, o personagem principal volta do mundo dos mortos e é guiado por um corvo para se vingar de seus assassinos. Mas isso é uma viagem cinematográfica, porque o corvo não é visto como uma “ave do mal” no contexto bíblico, nem na biologia.

No contexto bíblico

Como já vimos, o corvo é a primeira ave, especificamente citada na Bíblia, no livro de Gênesis. Note que o corvo era usado até na poesia hebraica: “Sua cabeça é ouro, o ouro mais puro; seus cabelos ondulam ao vento como ramos de palmeira; são negros como o corvo.” (Cânticos 5.11)

Biologia e Design Inteligente

Os corvos são conhecidos como animais dotados de inteligência para conseguirem alimento. Provavelmente, por esse motivo, Deus os escolheu para realizarem a difícil tarefa de encontrar comida em terra seca. Mas, devemos lembrar que, tanto humanos quanto aves, dependem de Deus para sobreviver.

“Considerai os corvos, que nem semeiam, nem segam, nem têm despensa nem celeiro, e Deus os alimenta; quanto mais valeis vós do que as aves?” (Lucas 12.24)

Você sabia que o corvo está entre os seis animais mais inteligentes do mundo? Na lista estão os golfinhos, chimpanzés, elefantes, papagaios, cães e corvos. Os corvos chamam a atenção por conta da facilidade de imitar sons, usar ferramentas com grau de complexidade para facilitar na obtenção de alimento e ainda são capazes de forjar a própria morte para enganar outros corvos e predadores naturais.

Em países como Japão, França e Estados Unidos, estudos universitários apresentam muitas descobertas sobre os corvos. Seguem alguns exemplos:

O corvo da Nova Caledônia (Corvus moneduloides), uma espécie que só existe nesse território ultramarino francês, na Oceania, coleta espontaneamente material de plantas para criar seus próprios “ganchos”, que ele usa para capturar aranhas e insetos.

Em 2015, uma menina americana de 8 anos, chamada Lisa, que costumava alimentar os corvos que visitavam o quintal de sua casa, teve uma experiência surpreendente. Os corvos comiam e depois deixavam pequenos objetos de presente nas bandejas vazias: brincos, pedras polidas, parafusos e até clipes. Coisas brilhantes e pequenas que podem ser transportadas nos bicos.

A mãe de Lisa começou a fotografar e registrar o comportamento das aves e percebeu a intencionalidade nas ações. Os corvos acompanham a menina no caminho da escola. Certo dia, ela perdeu a tampa da lente de sua câmera, e um dos corvos levou a tampa para sua casa, deixando-a no bebedouro. Essa amizade entre Lisa e os corvos virou notícia nos Estados Unidos.

No Japão, o corvo grande (Corvus corax), leva a castanha no bico, pousa em um fio de luz, perto de um semáforo, acima de uma faixa de pedestres. Quando o trânsito está mais intenso, deixa cair a castanha na pista e os carros que passam acabam por quebrá-la. O corvo usa a circulação automotiva como ferramenta. Ele espera pacientemente até acender a luz verde para pedestres e só então voa até a faixa para recolher a castanha já quebrada e pronta para ser consumida.

Mais sobre os corvos
A alimentação deles é extremamente variada, desde nozes, frutinhas e cereais, até roedores, répteis, peixes e filhotes de aves. Primariamente, os corvos são necrófagos, ou seja, se alimentam da carne de animais mortos.

É um poderoso voador, batendo forte e constantemente suas asas, ou planando sem esforço em amplos círculos, enquanto busca alimento. Os naturalistas consideram o astucioso corvo uma das aves mais adaptáveis e engenhosas. Ele tem por hábito armazenar sobras de alimento em fendas de rochas e demonstram devoção considerável por suas famílias.

Em vista de tudo disso, bem como por sua força de voo e habilidade de sobreviver com uma ampla variedade de alimentos, inclusive carniça, o corvo foi o candidato adequado para ser a primeira criatura a ser enviada por Noé para fora da arca. E foi escolhido por Deus para alimentar Elias naquela situação de seca.

Aplicação

Nesse estudo, aprendemos como o corvo é inteligente e como é possível que uma simples ave cumpra uma missão dada pelo Criador. Também vimos que Deus tem poder para suprir todas as nossas necessidades e que isso pode acontecer de maneiras extraordinárias. Abra a sua mente pra isso. Qual é o seu deserto ou a seca da sua vida? Não se preocupe, enquanto a chuva não vem, Deus multiplica o azeite e a farinha, traz de volta a vida, faz a lenha queimar, envia anjos e, se preciso for, dá ordem aos corvos. Essa é uma lição bíblica que nos ensina a não questionar a forma como vem a provisão.

Então, faça como o profeta Elias, que mesmo diante da calamidade, obedeceu a Deus e permaneceu perto do riacho, onde havia água para matar a sede e o alimento que chegou de uma maneira improvável, sobrenatural e extraordinária. E quando a fonte secar e não tiver mais água, é porque a chuva já está chegando. Confie!

“Por isso vos digo: Não andeis cuidadosos quanto à vossa vida, pelo que haveis de comer ou pelo que haveis de beber; nem quanto ao vosso corpo, pelo que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que o vestuário? Olhai para as aves do céu, que nem semeiam, nem segam, nem ajuntam em celeiros; e vosso Pai celestial as alimenta. Não tendes vós muito mais valor do que elas?” (Mateus 6.25-26)

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

Sangue de Jesus


 “Pois vocês sabem que não foi por meio de coisas perecíveis como prata ou ouro que vocês foram redimidos da sua maneira vazia de viver, transmitida por seus antepassados, mas pelo precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro sem mancha e sem defeito” (1Pe 1.18-19).

Cada cristão renascido de fato foi comprado por alto preço, ou seja, pelo “precioso sangue de Cristo”. Nem ouro e prata, nem mesmo todas as riquezas do universo seriam suficientes para nos resgatar da escravidão de Satanás, do pecado original e dos pecados cometidos e nos transferir para a comunhão com o Pai celestial. O alto preço do precioso sangue de Jesus foi necessário para a expiação dos nossos pecados! Diante disso, vemos duas coisas.

Primeira, o grave pecado. Não há nada para o compensar, encobrir ou justificar, só e unicamente o “precioso sangue de Cristo”. Com isso nos é apresentada a santidade de Deus sem restrições: ele, o Deus Santo e Onipotente, não pode manter qualquer comunhão com o pecador. A santidade (a pureza) de Deus, e o pecado (a impureza do homem) se excluem assim como o fogo e a água.

Segunda, o imenso e infinito amor de Deus. Quando lembramos sobre o que o Deus trino se dispôs a entregar, a sacrificar e a pagar para reconciliar, inocentar e resgatar o homem, então ficamos sem palavras. Esse Deus Eterno, Todo-Poderoso e Santo, que criou os céus e a terra, que é o Senhor sobre a vida e a morte, sem o qual nada do que vive poderia existir, que comanda miríades de anjos e poderia encher todo o universo com ouro e prata – esse Deus imortal tornou-se homem em Jesus Cristo para sofrer indescritíveis dores de corpo, alma e espírito e para derramar seu próprio sangue e morrer na cruz do Gólgota. Por isso este único sacrifício do Filho de Deus é perpétuo, eficaz e eterno. Deus não poderia ter pago um preço mais elevado. Pelo valor que Deus pagou por nós fica demonstrado quanto valor nós temos para ele. Seu amor pelo homem é revelado pelo sacrifício de seu único Filho e no sangue dele derramado na cruz. A Bíblia descreve esse imensurável amor do Eterno da seguinte maneira: “Mas Deus demonstra seu amor por nós: Cristo morreu em nosso favor quando ainda éramos pecadores” (Rm 5.8).

Observemos, agora, algumas coisas que nos mostram o alcance do sangue de Jesus.

Poder pelo sangue

O autor da carta aos Hebreus informa seus leitores, inspirado pelo Espírito Santo, que, “segundo a Lei, quase todas as coisas são purificadas com sangue, e sem derramamento de sangue não há perdão” (Hb 9.22). Já com o primeiro sacrifício, outrora feito logo após o pecado original, ficou claro que não pode haver perdão sem derramamento de sangue. Um princípio que tem plena validade, tanto até o Gólgota – o sacrifício completo de Jesus, o Cordeiro de Deus – como além dele. Não há perdão sem o precioso sangue de Jesus!

Redenção pelo sangue

O apóstolo Paulo escreve: “Nele [Cristo] temos a redenção por meio de seu sangue, o perdão dos pecados, de acordo com as riquezas da graça de Deus” (Ef 1.7). A redenção está naturalmente ligada com o perdão. Aqui também vemos que não há redenção sem o precioso sangue de Jesus.

Purificação pelo sangue

Em 1João o crente lê: “Se, porém, andarmos na luz, como ele está na luz, temos comunhão uns com os outros, e o sangue de Jesus, seu Filho, nos purifica de todo pecado” (1Jo 1.7). Aquele que teve sua culpa do pecado perdoada – que foi comprado da condenação do pecado pelo sangue de Jesus – pode comparecer purificado diante de Deus. Aliás, somente desse modo é possível ter comunhão com Deus em sua santidade!

Basicamente o Espírito Santo não pode manter comunhão com uma pessoa manchada com o pecado. Só é possível manter comunhão quando a pessoa é santificada. No entanto, isso requer a purificação de seus pecados, o que, por sua vez, só é possível pelo precioso sangue de Jesus. Se ainda não houver essa purificação, não será possível ter acesso direto a Deus nem manter comunhão com ele. Esse princípio já aparece na antiga aliança, com seus rituais de lavagem e purificação, aos quais os sacerdotes precisavam se submeter.

Justificação pelo sangue

A passagem de Romanos 5.9 diz para os renascidos: “Como agora fomos justificados por seu sangue, muito mais ainda, por meio dele, seremos salvos da ira de Deus!”. Nunca poderemos nos justificar diante do Deus Santo e Justo. Cada pessoa com maturidade é responsável por si mesma e não pode se desculpar por nenhum dos seus pecados. Apenas o sangue de Jesus pode nos justificar diante do Deus Santo.

A saída do povo de Israel do Egito ocorreu da mesma forma: os filhos de Israel foram justificados diante de Deus apenas pelo sangue do cordeiro imolado em cada comunidade familiar: “Quando eu vir o sangue, passarei adiante...” (Êx 12.13b). Deus não se interessou por nada mais além do sangue; este precisava estar disponível. Estando lá, o juízo de Deus passava por aquela casa. Se o sangue não estivesse visível numa casa de israelitas, não haveria justificativa nem possibilidade para que os moradores conseguissem fugir diante do juízo de Deus. Não tinha a mínima importância saber o tipo de pessoas que havia na casa, se eram pessoas religiosas ou não, amáveis e gentis ou tiranos e maldosos. Não, o único critério consistia em ter sangue do cordeiro visível, ou não, na viga superior e nas laterais da porta.

Paz pelo sangue

Lemos na carta aos Colossenses: “Pois foi do agrado de Deus... e por meio dele [Cristo] reconciliasse consigo todas as coisas, tanto as que estão na terra quanto as que estão nos céus, estabelecendo a paz pelo seu sangue derramado na cruz” (Cl 1.19-20). Quando duas pessoas se reconciliam, um acordo de paz é celebrado. A justificação, purificação, redenção e perdão pelo sangue de Jesus conduzem à paz com Deus. Sem o precioso sangue de Cristo, porém, não há paz entre Deus e o homem: não há paz no coração, não há paz na terra e não há paz no céu.

Santificação pelo sangue

Com base no sacrifício de animais na antiga aliança, cujo sangue era levado ao Lugar Santíssimo pelo sumo sacerdote e cujos corpos eram queimados fora do acampamento, lemos: “Assim, Jesus também sofreu fora das portas da cidade, para santificar o povo por meio do seu próprio sangue” (Hb 13.12).

Por meio do precioso sangue de Jesus Cristo os cristãos renascidos são santificados, separados para Deus e assim promovidos a uma posição excepcional. A verdadeira santificação pode acontecer unicamente com a purificação da culpa do pecado e esta, por sua vez, ocorre só e unicamente por meio do sangue de Jesus Cristo. Quem obteve desse modo a purificação de seus pecados não é mais um filho das trevas, ou de Satanás, mas é um filho da luz, ou de Deus (ver 1Jo 3.1-2). No entanto, sem o precioso sangue de Jesus, cada um continua sendo escravo de Satanás e um filho das trevas.

Acesso pelo sangue

Esse livre acesso, ou entrada, por meio do sangue de Jesus nos é apresentado claramente: “Portanto, irmãos, temos plena confiança para entrar no Lugar Santíssimo pelo sangue de Jesus” (Hb 10.19). Pela santificação estamos autorizados a entrar no santuário celeste. Na antiga aliança isso era permitido exclusivamente ao sumo sacerdote – mas apenas uma vez por ano. Com a restauração da comunhão com o Deus Santo, por meio do precioso sangue de Jesus, os filhos de Deus podem “entrar no Lugar Santíssimo” a qualquer tempo e não apenas uma vez ao ano. Sim, sendo membros da igreja de Jesus Cristo, nós mesmos nos tornamos um templo no qual habita o Espírito Santo (1Co 3.16-17).

Na prática, se ainda existisse esse templo com o Lugar Santíssimo, cada filho de Deus poderia entrar e sair dele a qualquer hora do dia ou da noite.

Por meio do seu sangue, Jesus Cristo proporcionou a redenção eterna para os seus, pois seu sacrifício é perene e válido para sempre. Agora ele representa os seus diante do Pai celestial: “Não por meio de sangue de bodes e novilhos, mas pelo seu próprio sangue, ele entrou no Lugar Santíssimo, de uma vez por todas, e obteve eterna redenção... para agora se apresentar diante de Deus em nosso favor” (Hb 9.12,24). Sim, por meio do seu sangue nós mesmos fomos promovidos à posição de reino e sacerdotes: “Ele [Jesus Cristo] nos ama e nos libertou dos nossos pecados por meio do seu sangue, e nos constituiu reino e sacerdotes para servir a seu Deus e Pai” (Ap 1.5b-6). Com relação a isso, lemos em 1Pedro 2.9-10: “Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz. Antes vocês nem sequer eram povo, mas agora são povo de Deus; não haviam recebido misericórdia, mas agora a receberam”.

Por meio do sangue de Jesus Cristo, agora cada filho de Deus tem legitimidade para – a qualquer hora do dia ou da noite – entrar no Lugar Santíssimo, ao qual ele mesmo pertence. Na tradução do teólogo Ludwig Albrecht, lemos o seguinte: “Assim, irmãos, temos a confiança de que a entrada para o Lugar Santíssimo está aberta para nós” (Hb 10.19). Na prática, isso significa que, se ainda existisse esse templo com o Lugar Santíssimo, cada filho de Deus poderia entrar e sair dele a qualquer hora do dia ou da noite. Sem o precioso sangue de Jesus, no entanto, a pessoa continua impedida de entrar na santa presença de Deus.

Vitória pelo sangue

“Então ouvi uma forte voz dos céus, que dizia: ‘Agora veio a salvação, o poder e o Reino do nosso Deus, e a autoridade do seu Cristo, pois foi lançado fora o acusador dos nossos irmãos, que os acusa diante do nosso Deus, dia e noite. Eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do testemunho que deram; diante da morte, não amaram a própria vida’” (Ap 12.10-11).

A vitória sobre a morte e o Diabo foi consumada por meio do precioso sangue de Jesus Cristo. Quando nos tornamos propriedade de Jesus, somos participantes da vitória por ele consumada e, desde então, sabemos que a morte não tem mais poder sobre nós. Temos a promessa da vida eterna!

Glória eterna pelo sangue

No diálogo que João manteve com relação à incontável multidão diante do trono e do Cordeiro, lhe foi dito: “Estes são os que vieram da grande tribulação, que lavaram as suas vestes e as alvejaram no sangue do Cordeiro. Por isso, eles estão diante do trono de Deus e o servem dia e noite em seu santuário; e aquele que está assentado no trono estenderá sobre eles o seu tabernáculo. Nunca mais terão fome, nunca mais terão sede. Não os afligirá o sol nem qualquer calor abrasador, pois o Cordeiro que está no centro do trono será o seu Pastor; ele os guiará às fontes de água viva. E Deus enxugará dos seus olhos toda lágrima” (Ap 7.14-17).

Sem o precioso sangue de Jesus não há vitória, nem vida eterna, e assim não haverá glória. Aquele que diz que “Jesus não precisou ir à cruz por minha causa!” não compreendeu nada do evangelho. Quem afirma que a mensagem da cruz é repulsiva e insensível não tem noção sobre a santidade e o amor de Deus. Quem não adora o Crucificado, mas apenas o bebê da manjedoura, ainda não compreendeu nada sobre o peso do pecado e suas consequências.

O que permanece é que não há perdão, nem redenção, nem purificação, nem justificação e nem paz sem o precioso sangue de Jesus Cristo. Sem o precioso sangue de Jesus Cristo não há santificação e sem santificação não há acesso a Deus. E sem o precioso sangue de Jesus não há vitória nem glória. Quanto mais devemos dizer “graças a Deus!” pelo sangue derramado de Jesus Cristo.

Thomas Lieth é pregador e responsável pelo trabalho editorial da Chamada na Suíça.

Sentimentos


À flor da pele


Stefan Yuri Wondracek

Este tempo de pandemia tem, com certeza, gerado em nosso coração todo tipo de emoções e sentimentos. É possível que muitos de nós tentemos superar nossas crises internas dizendo para si mesmo que isso tudo irá passar. Logo, logo chegará ao seu fim. Mas, infelizmente, não é isso que tem acontecido. Os dias têm se prolongado; semanas acabaram tornando-se meses, e agora estamos quase fechando um ano. O isolamento superou qualquer expectativa que tínhamos. Além disso, pessoas têm adoecido ao nosso lado e algumas, tristemente, falecido. Estamos definitivamente vivendo tempos difíceis.

A pergunta que surge é: como fica o nosso coração diante de tudo isso? Como lidar com todos esse fatos? A verdade é que facilmente entramos em paranoia e nos deixamos levar para o fundo do poço. Ficamos amedrontados, receosos, ansiosos, irados; nos sentimos solitários, tristes e frustrados. E a lista de sentimentos ruins só tende a aumentar à medida que a pandemia avança.

Mas nós somos cristãos, certo? Temos um Deus poderoso que opera milagres e nos ama. Então sabemos que há algo no que sentimos que está terrivelmente errado. Não deveríamos nos sentir assim – de jeito nenhum. Afinal, somos filhos do Rei dos reis! Somos herdeiros do reino dos céus. Não nos é permitido sentirmos tais coisas. É indigno da nossa posição. Até porque a Bíblia diz para não nos irarmos, para não andarmos ansiosos. Também diz que devemos nos alegrar no Senhor. Ou seja, o desânimo não deve ocupar nosso coração.

Apesar de tudo isso ser verdadeiro, com esse tipo de cobrança experimentamos uma pressão moral que só piora a bagunça do nosso coração e que nos leva a uma tendência de reprimir sentimentos que podem parecer tão desprezíveis aos nossos olhos. Assim, reprimimos o que sentimos e escondemos nossas emoções no poço mais fundo da nossa alma, só para então nos darmos conta de que estes sentimentos não se vão tão facilmente, não obedecem a nossas ordens de retirada. E agora, para agravar a situação, ficamos desolados e com um sentimento de impotência diante da incapacidade do autocontrole. Parece que quanto mais os enterramos, mais eles querem mostrar sua face macabra e nos atormentar.

Mas, então, o que fazer para não naufragar neste tempo tão tumultuado de sentimentos à flor da pele? A resposta mais assertiva, correta e simples é: corramos para debaixo das asas de nosso amado Pai celestial, nos apossando das bênçãos que temos em Jesus, através de seu sacrifício na cruz do Calvário e nos enchendo do Espírito Santo de Deus. As Escrituras nos instruem nesta caminhada.

Fomos criados à imagem e semelhança do Deus trino. Assim como Deus, somos seres espirituais, racionais, relacionais, lógicos, volitivos e – certamente – sentimentais.

Talvez você ainda dirá: “Mas isso é muito generalista e abstrato, como levo isso para a prática? Tenho orado, lido a Bíblia, assistido aos cultos online, participado de grupos pequenos pelo Zoom, mas não consigo mudar o que sinto. E isso só me deixa ainda mais ansioso e aflito”. Sim, entendo você. Por isso te convido a trazer à memória algumas verdades que podem servir como luz ao coração e à mente nesta virada de ano.

Em primeiro lugar, lemos em Gênesis 1.27 que fomos criados à imagem e semelhança do Deus trino, o que inclui a sua pessoalidade. Ou seja, assim como Deus, somos seres espirituais, racionais, relacionais, lógicos, volitivos e – certamente – sentimentais. Deus é assim. Podemos dizer categoricamente que Deus não é simplesmente uma força, um vulto, uma energia. Ele é uma pessoa. E Deus implantou essa característica no homem que criou. Sendo assim, podemos dizer que tudo o que sentimos é essencialmente humano. Não há nada fora do natural. Então não devemos crer que esconder dos nossos próprios olhos o que sentimos é a melhor opção. Desviar os olhos do problema nunca é a melhor opção. Precisamos, sim, entender o que sentimos. Devemos trazer tudo à tona. Não quero dizer com isso que você deve extravasar a sua raiva e chutar o primeiro cãozinho que te cruze o caminho. O que estou querendo dizer é que devemos “cavocar” o nosso coração e buscar entender o que está lá dentro, no mais íntimo de nosso ser.

Talvez possamos fazer uma analogia com um iceberg. Fazemos de tudo para deixar a ponta do iceberg de nossa vida com a melhor aparência possível. (Aos olhos dos outros, aos nossos mesmos e, se for possível, também aos olhos de Deus.) Isso inclui não ter determinados sentimentos. O fato é que 90% da nossa vida não consiste no que se vê, mas naquilo que está arraigado no nosso âmago. Coisas que estão tão profundas que nós mesmos não sabemos que estão lá e menos ainda sabemos como lidar com elas. São motivações, desejos, expectativas... e isso tudo gera aquilo que sentimos.

Retornemos a Gênesis. Deus criou então o homem com seus sentimentos em todo o seu potencial e beleza. No entanto, os primeiros de nós, Adão e Eva, permitiram que o pecado entrasse na natureza da humanidade e corrompesse a beleza que há na complexa criação divina. Com isso, motivações, desejos e expectativas que eram voltadas e supridas no Criador, Senhor e Pai, agora mudaram seu foco para a criação, as coisas criadas (Romanos 1.25). E uma verdade absoluta sobre as coisas criadas é que elas são mutáveis, passageiras e instáveis. Num momento estão lá, no outro já não estão. Então tudo o que é construído sobre esse solo arenoso termina por desabar em algum momento. Sentimentos que eram perfeitos e completos agora são incertos e inseguros, vacilantes devido à contaminação do pecado na raça humana.

Mas reconheço e entendo que sentimentos não são controláveis em si. Não determinamos de maneira lógica e volitiva o que sentimos. O que devemos fazer é buscar conhecer as raízes desses sentimentos. Entender em que se baseiam. Arrisco a dizer que podemos pensar nos sentimentos como porta-vozes do coração. Instrumentos implantados pelas mãos de Deus na natureza humana para chamar nossa atenção ao que está dentro. É um chamado para a introspecção. Um chamado à transformação. Sentimentos não devem ser enterrados, mas sim curados.

Em segunda lugar, uma vez que entendemos nossos sentimentos, peça ao Espírito Santo que te ajude a buscar em seu interior as suas bases. O Espírito sabe o que pensamos e tudo o que falamos antes mesmo das palavras saírem de nossa boca. Portanto, devemos dizer como o salmista: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me e conhece as minhas inquietações” (Salmo 139.23).

Sentimentos não devem ser enterrados, mas sim curados.

Estude a Palavra. Estude não como quem está passeando, mas como quem anseia encontrar algo, como quem anseia descobrir a resposta para suas inquietações. Fale com pessoas sábias, leia livros cristãos que possam ajudá-lo a entender o próprio coração.

Em terceiro lugar, encha o seu coração com as verdades de Deus. “Empanturre” sua alma com as promessas divinas, com os atributos dele, conforte seu coração com o perdão e a esperança de vida presente e eterna que só Cristo, através do seu sacrifício, pode lhe dar.

Como diz o apóstolo Paulo: “Mantenham o pensamento nas coisas do alto, e não nas coisas terrenas” (Colossenses 3.2), e: “Assim, fixamos os olhos, não naquilo que se vê, mas no que não se vê, pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno” (2Coríntios 4.18).

Curar nossas emoções não é tarefa fácil. Exige muito esforço, persistência, fortes convicções na eterna Palavra de Deus e total dependência de Deus, pois a maturidade espiritual e emocional só pode vir com um milagre operado por Cristo em nosso coração.

Que neste novo ano Deus te abençoe e te dê emoções que reflitam um coração centrado nas coisas eternas.