domingo, 30 de setembro de 2018

Por Que Deveríamos Fugir das Redes Sociais? (E Porque Não Fugimos)




POR QUE DEVERÍAMOS FUGIR DAS REDES SOCIAIS? (E Por Que Não Fugimos?)

Publicado por  Reformados 21 em  12/09/2018


Mais um ex-executivo do Facebook emitiu um alerta sobre como o seu antigo empregador nos condicionou a maus hábitos, envenenou nossa vida social, roubou nossa sanidade e sabotou nossos relacionamentos mais íntimos. Desta vez, foi Chamath Palihapitiya, de 41 anos, agora um empreendedor de alto risco e co-proprietário do time de basquete “Golden State Warriors”, da NBA.

FALSA E FRÁGIL

Palihapitiya falou recentemente aos alunos do curso de pós-graduação em administração da Universidade de Stanford, explicando como o Facebook corrompe a linguagem social.

Os circuitos de resposta rápida e movidos à dopamina que criamos estão destruindo a forma como a sociedade funciona. Moldamos nossas vidas em torno desse senso aparente de perfeição porque somos recompensados ​​em curto prazo (acenos, corações, curtidas), e associamos isso com valor, associamos isso com a verdade. Contudo, na realidade, esta é uma popularidade falsa e frágil; e isso nos deixa ainda mais vazios.

Este vício agora contamina toda a base de dois bilhões de usuários do Facebook, disse ele. Tudo planejado. “Não percebemos isso, mas estamos sendo programados”, advertiu Palihapitiya, repudiando perante os alunos a ideia de que muita inteligência e uma boa formação os imunizariam contra a praga. Não imunizam!

ENTÃO, QUAL É A RESPOSTA

“Cada um deve decidir o quanto de sua independência intelectual está disposto a abrir mão”, disse ele. “Não tenho uma boa solução. Minha solução é: simplesmente não uso mais essas ferramentas. Já faz anos”. Em outras palavras, saia definitivamente das Mídias Sociais!

VICIADOS EM REDE SOCIAL

Parece bom. Parece simples. Basta se desligar das Mídias Sociais. Mas é claro que não é assim que funciona. Os cristãos sabem que existem desejos mais profundos por trás dos vícios digitais. Mesmo com todos os hábitos de Rede Social que afligem nossas vidas, com toda a falta de atenção aos que nos rodeiam, a maioria de nós jamais consideraria seriamente desativar nossas plataformas sociais (até mesmo Palihapitiya mantém uma conta ativa no Facebook).

As Redes Sociais viciam cada um de nós. Amamos participar dos debates nos comentários do Facebook, emplacar o GIF perfeito, o Twitter, ou espalhar outra selfie descartável no Snapchat. A sedução das mídias é o desejo de ser visto de forma onisciente, ser sempre “ovacionado” e estar sempre visível aos outros. Os smartphones prometem nos proteger da “atazagorafobia”, que é o medo de ser esquecido. Desta forma, nos comunicamos impulsivamente, desde que acordamos até o momento em que adormecemos.

Tudo isso condiciona nosso comportamento digital e beneficia as plataformas sociais, que proporcionam bilhões de dólares em lucro. As nossas emoções são condicionadas e autocondicionadas. Nós fazemos isso a nós mesmos. Como disse um escritor: “Cada plataforma de Rede Social é uma droga que prescrevemos a nós mesmos; consumimos para regular a nossa vida emocional, e estamos constantemente fazendo experiências com a combinação”.

ENFRENTANDO O SILÊNCIO

As Mídias Sociais são um coquetel de drogas que estimulam as emoções, e que misturamos para nós mesmos. E, sair das Redes Sociais, mesmo que por alguns dias, ou apenas por algumas semanas, significa encarar a dura realidade de que nossos colegas não irão perceber nossa ausência; ninguém irá perceber o nosso silêncio, e não ficarão ansiosos por nossa volta. Fugir das Mídias Sociais é provar a picada amarga do esquecimento, uma pequena pitada da solidão dos idosos, ou da crise de identidade da meia-idade, que agora se espalha por todos os estratos demográficos.

Se decidirmos parar de sermos vistos nas Redes Sociais, iremos desaparecer completamente; mas não ousamos parar. É por isso que o primeiro passo para sair definitivamente da Mídia Social, o primeiro dia desconectado, tem um gosto amargo. Isso porque usamos os sons das notificações em nossas vidas para reprimir duas coisas que preferimos não enfrentar.

O SILÊNCIO E O EU

Em seu sermão sobre o Salmo 62:1 – “Somente em Deus, ó minha alma, espera silenciosamente” – Dietrich Bonhoeffer explica o medo moderno do silêncio e mostra como o homem o repele pelo uso das Redes Sociais, um fenômeno que operava na Alemanha, no final da década de 1920.

Ele disse que, primeiro, buscamos novos sons para evitarmos a nós mesmos.

“Nós fugimos do silêncio”, disse Bonhoeffer. “Corremos de uma atividade a outra, para evitar ficarmos sozinhos com o nosso eu, mesmo que apenas por um momento, e para evitar também de nos olharmos no espelho. Estamos entediados com nós mesmos, e, muitas vezes, as horas mais desesperadas e desperdiçadas são aquelas que somos obrigados a passar sozinhos” (Works [Escritos] 10:503).

Odiamos isso. O silêncio força, inevitavelmente, que as verdades desconfortáveis ​​voltem à nossa mente. Tudo sobre nossas vidas: quem somos, quem nos tornamos, bons, o maus, o entediante, as coisas que gostaríamos de mudar, as memórias, fatos e cicatrizes que nunca apresentaríamos nas Redes Sociais. No silêncio, porém, nada sobre nós permanece escondido; tudo emerge novamente para a superfície. Tirar e compartilhar novas selfies é sempre mais fácil do que o medo do desconhecido, que surgirá se tudo ficar silencioso.

Entretanto, o nosso medo do silêncio pessoal expõe algo ainda mais profundo.

O SILÊNCIO E JESUS

Repetidamente, nas Escrituras, o silêncio é uma demonstração de nossa fé constante, uma confiança decidida no Redentor para mover, agir e salvar. Quando as tentações e os perigos aumentam, os cristãos piedosos podem acalmar os sons alarmantes à sua volta e recuperar o silêncio.

Na tranquilidade e na confiança reside a força de vocês (Isaías 30:15).

Descanse no SENHOR e espere nele (Salmo 37:7).

Somente em Deus a minha alma espera silenciosa; dele vem a minha salvação (Salmos 62:1).

Somente em Deus, ó minha alma, espere silenciosa, porque dele vem a minha esperança (Salmo 62.5).

O silêncio revela confiança em Deus. O silêncio também é um convite divino. E este é o medo moderno mais profundo.

“Não somente temos medo de nós mesmos, de nos descobrirmos e nos desmascararmos”, escreveu Bonhoeffer, “mas temos ainda mais medo de Deus, de que ele possa perturbar o nosso silêncio, nos descobrir e nos desmascarar. Que Deus possa nos atrair para uma comunhão mais profunda e fazer conosco o que Ele quiser. Por temermos encontros tão inquietantes e solitários com Deus, nós o evitamos; evitamos até mesmo pensar em Deus, para que, de repente, ele não se aproxime demais de nós. Ter que “olhar nos olhos de Deus”, ter que ser responsável perante Ele, é uma ideia terrível; o nosso sorriso perpétuo pode desaparecer, as coisas podem ficar sérias demais, de modo que não estamos nem um pouco acostumados”.

A frágil e falsa popularidade digital e a presença de Deus se aproximam. O que parece mais atraente nesta era? Geralmente, acordamos e pegamos nosso smartphone direto da cama.

Essa ansiedade caracteriza toda a nossa época. Vivemos com medo perpétuo de sermos apreendidos repentinamente e chamados por Deus a servi-lo, preferindo socializar, ir ao cinema, ou ao teatro, até que finalmente sejamos levados aos nossos túmulos. Qualquer coisa é melhor do que ter de suportar um único minuto diante de Deus (Works [Obras] 10:503).

Cada momento silencioso em 1928 poderia ser interrompido pela vida social ou pela mídia. Noventa anos depois, podemos manter o som de distração da vida social e das redes simultaneamente.

A Mídia Social não é o problema; é a máscara dos nossos medos ocultos. Todos nós queremos notícias novas e urgentes, ou tweets virais, ou uma nova mensagem de texto, porque significa que, por pelo menos mais um momento, evadimos o contato visual com o Salvador e a seriedade do que significaria encontrá-lo, ouvi-lo, e encarar o chamado de Deus que pode atrapalhar as nossas vidas confortáveis.

O SILÊNCIO E A IGREJA

Bonhoeffer não está comemorando o isolamento social e a solidão. Há um silêncio que decorre de nossa condição humana caída. Bonhoeffer está ressaltando o silêncio intencional, o qual devemos aprender a praticar, o que agora chamamos de “solidão”, a decisão de escolher o silêncio e a tranquilidade quando há oportunidades de barulho. O silêncio escolhido é a nova expressão do empoderamento social na era digital. O silêncio é liberdade. E o silêncio é uma forma de proteger a saúde da igreja local.

À medida que o ministério de Bonhoeffer se desenvolveu, ele tomou as duas verdades deste sermão inicial (que o silêncio nos obriga a enfrentar a nós mesmos, e que ele nos alerta para a voz e o chamado de Deus) e as aplicou à vida em comunidade.

Em seu livro, Vida em Comunhão, ele diz que “aprendemos em comunidade a paciência e a honestidade necessárias para ficarmos sozinhos. Enquanto estamos sozinhos, conhecemos a Deus e desenvolvemos a autenticidade necessária para o florescimento social. “Quem não consegue ficar sozinho deve ter cuidado com a comunidade. Quem não suporta estar em comunidade deve ter cuidado ao estar sozinho” (Works [Obras] 5:83).

Em um mundo saturado de Redes Sociais, na onipresença do eu, perdemos a disciplina do silêncio. Perdemos um senso de ouvir a Deus. Ele parece distante. Ficamos vazios da verdade divina, a qual necessitamos possuir antes de podermos oferecer graça aos nossos irmãos e amigos.

Destarte, Bonhoeffer perguntou em seu tempo, e nos pergunta agora: “A Palavra de Deus está com você, como conforto e força? Ou você usa indevidamente a “solidão” contra a comunidade, contra a Palavra e a oração? Os indivíduos devem estar conscientes de que, mesmo as horas que são gastas sozinhas, reverberam na comunidade. Na “solidão” podemos fragmentar e manchar a comunidade, ou podemos fortalecê-la e santificá-la. Todo ato de autodisciplina de um cristão também é um serviço para a comunidade” (Works [Obras] 5:92).

Uma comunhão saudável em nossas igrejas nunca irá acontecer enquanto cada membro abusar das Mídias Sociais e deixar de prestar atenção à sua própria solidão.

SOLIDÃO PIEDOSA

Nesta era midiática isso pode soar antinatural. Estranho. Bonhoeffer confirma que “vai parecer bastante engraçado, talvez até vazio nas primeiras vezes. Em pouco tempo, no entanto, a alma ficará cheia; ela ficará mais forte” (10:504). Ele também poderia estar falando dos primeiros dias longe das Redes Sociais.

Bonhoeffer acreditava que era uma obra especial do Espírito Santo levar cada crente a esta serena solidão, no lugar calmo onde as nossas necessidades mais profundas são expostas, e as maiores verdades eternas podem mais uma vez impregnar nossas almas. Porque quem, sozinho, sem o poder do próprio Deus, poderia desejar o silêncio em uma era de autoprojeção incessante?

Pelo poder do Espírito, aprendemos a abraçar a seriedade desacostumada da solidão, enquanto oramos com o sentimento dos primeiros versículos do Salmo 139:

SENHOR, tu me sondas e me conheces. Sabes quando me sento e quando me levanto; de longe conheces os meus pensamentos. Observas o meu andar e o meu deitar e conheces todos os meus caminhos.

sábado, 29 de setembro de 2018

O Princípio de Mordecai


O Princípio de Mordecai

Thomas Lachenmaier
Mordecai, homem fiel a Deus e que é mencionado no livro de Ester, não dobrava seus joelhos diante de ninguém, exceto diante de Deus. Também hoje a observação desse princípio não causa prejuízo a ninguém.
O psicanalista judeu Michael Amram Rinast (68) não recebeu muita influência da fé judaica por meio de seus pais. O seu pai faleceu cedo e sua mãe era ateísta. Sua avó, no entanto, acendia cada sexta-feira à noite a vela do Shabbat, e assim ele tinha conhecimento de alguns costumes judaicos e, no decorrer de sua vida, novamente se aproximou mais da fé judaica. Ele relata que recebeu de sua avó o que seria “a frase mais marcante de sua vida: ‘Você nunca se ajoelhará diante de ninguém, exceto diante de Deus!’. Assim, esse é o princípio de Mordecai”.
Michael Amram Rinast, nos últimos 25 anos de sua vida profissional como consultor administrativo, orientou-se por essa máxima da vida de Mordecai, o homem fiel a Deus, que nos foi transmitida no livro de Ester. Isso lhe custou contratos e clientes, ele relatou. Isso lhe causou prejuízo? Provavelmente não. Ele se manteve fiel a si mesmo e a um princípio bíblico.
Mordecai era um homem sábio, conforme lemos na Bíblia, e a ação prática fazia parte de sua sabedoria de nunca dobrar os joelhos diante de alguém, exceto diante de Deus. Mordecai demonstrou ser um cidadão leal, mesmo estando na Diáspora persa para onde foi levado juntamente com muitos israelitas. No entanto, ele não dobrou seus joelhos diante dos governantes do mundo. Mordecai era temente a Deus e não temente aos homens. Como seria possível – de um modo geral – que uma pessoa tivesse prejuízo ao agir em obediência a Deus e não se prostrar diante dos ídolos desse mundo?
O amor ao próximo de que fala a Bíblia vale para a pessoa, que é uma criatura de Deus. Ele não inclui a aceitação daquilo que ela faz ou até a quem ela adora.
O desafio bíblico de não dobrar os joelhos diante de falsos deuses – e nem diante de governantes desse mundo ou homens poderosos – hoje é tão atual como foi à época de Mordecai. Refletir sobre esse tema pode aguçar nosso olhar para descobrir quais são os ídolos de nossa época. A isso certamente pertence o espírito da época que nos leva à busca incessante da realização de nossas próprias necessidades, de trocar a individualidade pelo egoísmo? Não seria igualmente o caso de participar do grande coral, de que cada um tem razão à sua maneira, e que assim também o deus do Islã finalmente seria o mesmo que nos fala através da Bíblia? Não dobrem seus joelhos diante de quem não é Deus, de quem participa do quebra-jejum dos muçulmanos ou, sendo cristão, apoia a construção de mesquitas – aplicando erroneamente o mandamento do amor ao próximo. O amor ao próximo de que fala a Bíblia vale para o próximo, o indivíduo, à pessoa que é uma criatura de Deus. Ela não inclui a aceitação daquilo que ele faz ou até a quem ele adora.
Quem não estabelece essa diferença perde a visão para aquilo que realmente importa quanto ao amor para um muçulmano: tratá-lo amistosamente e com respeito e professar a quem unicamente devemos adoração e diante de quem todos os joelhos se dobrarão – exatamente como a Palavra de Deus confirma. Lemos sobre isso, entre outras passagens, em Isaías 45.23; Romanos 14.11; Filipenses 2.10. Quão facilmente acompanhamos os uivos dos lobos do espírito da época e com isso deixamos de direcionar o olhar dos outros para aquele diante de quem devemos dobrar nossos joelhos – diante do Deus que podemos chamar de Aba, Pai, e que se aproximou magnificamente de nós por meio de Jesus Cristo.
O relato bíblico da bela Ester, que no decorrer desses acontecimentos amadureceu e aprendeu a ser fiel a Deus e a “fazer o que deve ser feito” (mesmo que pudesse ter consequências graves, até com a perda da sua vida), serve hoje para nos ensinar e inspirar para seguir a Jesus com novo ânimo. Assim como foi na época de Ester e Mordecai, também hoje o inimigo de Deus quer a submissão. No final da história, ele vai requerer a submissão total de todas as pessoas, ele quer ver o sinal de submissão na mão ou na testa de cada um.
De acordo com as probabilidades, a rejeição a essa submissão diante do maligno terá as mesmas graves conse­quências como as que ameaçaram a Ester e a Mordecai. Quem não aceitar o sinal terá mais prejuízos do que apenas contratos e clientes. Ele não conseguirá comprar nem vender, e assim estará excluído totalmente da vida cotidiana. Evidentemente muitos serão mortos por não dobrarem seus joelhos. Os discípulos de Jesus serão “perseguidos e condenados à morte” (ver Mt 24.9). A Bíblia relata (Ap 20.4) que esses fiéis discípulos de Jesus serão decapitados. As pessoas que assassinarem os cristãos o farão crendo que estão “prestando culto a Deus” (ver Jo 16.2-3).
Isso aconteceu com frequência na história, principalmente desde o surgimento do Islamismo, no início do século VII. Matar pessoas acreditando que está prestando serviço para Deus é algo que se estende através de toda a história islâmica. Quando os turcos otomanos, em 1480, comandados por Ahmed Pasha, conquistaram Otranto, a cidadezinha portuária ao sul da Itália, eles colocaram as pessoas diante da escolha: dobrar os joelhos e aceitar o islamismo ou ser decapitado. Os cristãos daquela região de Apúlia não dobraram suas frontes diante de nenhuma exigência de submissão, nem diante de ídolo algum.
Os muçulmanos decapitaram o bispo e centenas de pessoas em plena catedral. O governo da cidade havia sido entregue ao veterano alfaiate Antonio Pezzulla. Também ele se negou a aderir ao islamismo. Ele foi decapitado juntamente com mais de 800 pessoas. É isso que acontece em nossos dias, quando cristãos são assassinados pelo fato de serem cristãos. Os assassinos alegam estar prestando um serviço ao seu deus e o confirmam dizendo: “Allahu Akbar” (“Alá é Grande”).
Mesmo assim, não há razão para a submissão. A alternativa divina da Bíblia diz que essa obediência e essa rejeição à falsa submissão, no final, não causa perdas, mesmo que possa parecer, mas conduz à vida eterna. João escreve sobre isso em Apocalipse 20.4: “Vi as almas dos que foram decapitados por causa do testemunho de Jesus e da palavra de Deus. Eles não tinham adorado a besta nem a sua imagem, e não tinham recebido a sua marca na testa nem nas mãos. Eles ressuscitaram e reinaram com Cristo durante mil anos”.
Deus pode capacitar pessoas a não dobrarem seus joelhos diante de ninguém, sob nenhuma circunstância, quando estas confiarem totalmente na sua Palavra, na afirmação de Jesus: “Não tenham medo dos que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Antes, tenham medo daquele que pode destruir tanto a alma como o corpo no inferno” (Mt 10.28). — factum-magazin.ch

quarta-feira, 5 de setembro de 2018

A Reforma Protestante


A Reforma Protestante e o Pré-Milenismo


Martinho Lutero (e os outros reformadores protestantes do século XVI) causou uma transformação imensurável à igreja ao exigir reforma. Eles declararam que a teologia da igreja na Europa Ocidental era um desvio do ensinamento bíblico apostólico. O chamado de mobilização dos reformadores foi sola Scriptura, que significava que somente a Bíblia era a autoridade sobre eles, em contraste com o papa, os concílios eclesiásticos ou a tradição. Ao chamarem a igreja para viver tendo somente a Bíblia como autoridade sobre ela, os reformadores não tentaram transformar sua escatologia.
A negligência em aplicar os princípios de sola Scriptura a toda a Escritura resultou em muitos cristãos negando uma interpretação plena e literal da Bíblia. Por exemplo, as porções históricas da Bíblia são consideradas alegóricas, e as seções proféticas das Escrituras sofrem um destino ainda pior.
A negligência em aplicar os princípios de sola Scriptura a toda a Escritura resultou em muitos cristãos negando uma interpretação plena e literal da Bíblia.
A Reforma (1500-1650) foi uma revolução teológica e a interpretação bíblica também testemunhou uma transformação por causa da revolução teológica. Ramm escreveu: “Embora os historiadores admitam que o Ocidente estivesse maduro para a Reforma devido às várias forças em atuação na cultura europeia, houve uma Reforma hermenêutica que precedeu a Reforma eclesiástica”.[1] Zuck explicou as forças em atuação como “a abordagem literal da Escola de Antioquia e dos vitorinos”.[2] O legado do escolasticismo também foi um fator que contribuiu para a Reforma, uma vez que as línguas bíblicas foram reavivadas durante aquele período. Homens como Lutero e Calvino retornaram ao texto bíblico e à atratividade natural da interpretação mais cientifica e literal das Escrituras.
A importância que Lutero dava à interpretação literal também significou uma ênfase sobre as línguas originais. Rejeitando alegorias, Lutero enfatizava o sensus literalis. Ele afirmou: “Não conseguiremos preservar por muito tempo o evangelho sem as línguas. As línguas são a bainha na qual esta espada do Espírito está contida”.[3] Não obstante, uma pessoa deve ser mais do que um filólogo, um historiador, ou mesmo um teólogo; o Espírito Santo deve iluminar a mente do intérprete. “Lutero exigia uma leitura ‘simples’ ou ‘literal’ das Escrituras, que não se baseava nem em distinções filosóficas nem em distinções complicadas, argumentações teológicas formalizadas de objeções e respostas”.[4]
Os escritos de Lutero estavam repletos de escatologia, mas ele não foi um revolucionário (diferentemente de alguns dos anabatistas do século XVI). Ele interpretava os acontecimentos do seu tempo como profecias sendo cumpridas. Assim, eventos da época, tais como as chamadas aparições de 1529, a onda de calor subsequente ao eclipse solar de 1540, a disseminação da sífilis e a mudança do nível da água de uma das hidrovias comerciais da Europa central foram interpretados como sinais do retorno de Cristo.[5] O papado era considerado o Anticristo e os turcos foram tidos como os servos do Anticristo.[6] A identificação que Lutero fez do Anticristo significava que “os últimos dias estão às portas” e o fim da história está próximo. Lutero via seu tempo presente como o da grande tribulação, que teria seu clímax, sem demora, através do retorno de Jesus Cristo.[7] Às vezes ele espiritualizava o milênio, enquanto que em outras ocasiões Lutero afirmava que o milênio já havia passado. Lutero não estabeleceu datas para o final dos tempos, e na maior parte do tempo ele cria estar em algum lugar entre o milênio e o final da era.[8] João Calvino também acreditava que o papado fosse equivalente ao Anticristo.[9]
Como a escatologia não era uma questão de importância maior durante a Reforma, os reformadores não tiveram a oportunidade de aplicar sua hermenêutica consistentemente; todavia, quando a aplicaram, esse fato levou ao reavivamento do pré-milenismo.
Lutero não desenvolveu suas visões escatológicas sistematicamente porque a sua ênfase estava nas questões soteriológicas; desta forma, ele pôde manter a perspectiva amilenar (agostiniana) do catolicismo romano. Os reformadores abandonaram o método alegórico de interpretação (característico do catolicismo) em todas as áreas, exceto na escatologia. O amilenismo é o ponto de vista profético da Igreja Católica, e foi também o ponto de vista profético dos grandes reformadores. O motivo pelo qual os reformadores retiveram o amilenismo do catolicismo foi a época em que viveram. Eles abraçaram, sim, uma interpretação gramático-histórica das Escrituras relativamente à soteriologia e à eclesiologia. Como a escatologia não era uma questão de maior importância, os reformadores não tiveram a oportunidade de aplicar sua hermenêutica consistentemente.
No final dos anos 1500 e início dos anos 1600, os intérpretes pré-milenistas começaram a prosperar em consequência da interpretação bíblica durante o período final da Reforma. Durante o século XIX, a Revolução Francesa e as ações de Napoleão angustiaram os cristãos, o que fez com que alguns temessem que o imperador pudesse ser o Anticristo; desta forma, desenvolveu-se um interesse renovado pela profecia bíblica. Por exemplo, Lady (Theodosia) Powerscourt realizou uma dentre muitas reuniões que buscavam tratar das preocupações proféticas. John Nelson Darby (1800-1882) foi convidado para as Conferências de Powerscourt de 1831 a 1833, que tiveram uma influência duradoura sobre ele. A transição daquela época da igreja para o reino milenar, no qual Israel tinha proeminência sob o governo de Cristo, era entendida através da interpretação da septuagésima semana de Daniel 9 como sendo futura. Baseado em uma crença resoluta em uma interpretação literal das Escrituras, ele desenvolveu um desenho preciso para os acontecimentos escatológicos. Darby acreditava em uma distinção entre Israel e a igreja que se estendia pela eternidade. Ele também ensinava que as dispensações são economias de Deus e que a era da igreja é um parêntese. Darby começou primeiro a articular suas visões sobre um arrebatamento pré-tribulação e a desenvolver seu pensamento dispensacionalista durante sua convalescença (dezembro de 1826 a janeiro de 1827). Em 1833, ele desenvolveu uma sistematização completa de escatologia, ou daquilo que é conhecido como dispensacionalismo pré-milenista.
Embora o dispensacionalismo não tenha sido sistematizado como doutrina até os anos 1800, com John Nelson Darby, houve indivíduos em toda a história da igreja que afirmavam um sistema dispensacionalista de uma certa variedade. Dois dos primeiros proponentes do dispensacionalismo incluem o batista James R. Graves (1820-1893) e o presbiteriano James H. Brookes (1830-1897). O dispensacionalismo foi comunicado amplamente por meio de conferências bíblicas tais como a Conferência Bíblica de Chicago (1878-1909), e por meio de numerosas publicações. Uma faculdade de teologia ou um instituto bíblico de pós-graduação que articulava os ensinamentos do dispensacionalismo podia ser encontrado em quase que todas as principais regiões metropolitanas dos Estados Unidos. Inicialmente, o dispensacionalismo foi ensinado entre os batistas, as igrejas bíblicas e as igrejas independentes, além de um número significativo de congregações presbiterianas. Muitas das denominações pentecostais, tais como as Assembleias de Deus e a Igreja do Evangelho Quadrangular, adotaram o dispensacionalismo, e este foi também dominante em meio ao movimento carismático durante os anos 1960-1970. Embora o dispensacionalismo ainda seja amplamente ensinado entre os evangélicos e os fundamentalistas, sua influência começou a se dissipar dentro da academia primeiramente nos anos 1950-1960. O ensino dispensacionalista também declinou nos anos 1980, à medida que mais carismáticos, evangélicos e pentecostais se tornaram preocupados com questões sociais.
Aspectos não desenvolvidos da teologia dispensacionalista podem ser identificados anteriormente ao século XIX, especialmente em meio à igreja primitiva e muitos séculos antes de Darby. O dispensacionalismo clássico (em torno dos anos 1878-1940) é um termo que denota a teologia dos dispensacionalistas – tanto nos Estados Unidos quanto no Reino Unido – entre os escritos de Darby e os de Lewis Sperry Chafer (especialmente os vários volumes denominados Teologia Sistemática, escritos por este último). As notas interpretativas dentro da Bíblia de Estudo Scofield são representativas do dispensacionalismo clássico.
Um aspecto significativo do dispensacionalismo clássico foi a noção dualística da redenção, relativamente a propósitos celestiais e terrenos. O dispensacionalismo revisado (modificado) (em torno de 1950-1970) é uma designação adotada a partir da revisão de 1967 da Bíblia de Estudo Scofield. Dispensacionalistas revisados rejeitaram a distinção dualista eterna entre os povos terrenos e os celestiais, com ênfase, em vez disso, nos dois povos de Deus (Israel e a igreja), cada um com diferentes responsabilidades no que se refere à dispensação, porém ambos eternamente salvos da mesma maneira. Outra ênfase importante foi a rejeição de duas novas alianças, uma para o Israel nacional (Jr 31.31-34; Hb 8.7-12) e uma para a igreja (Lc 22.20). O dispensacionalismo progressivo (desde os anos 1980 até o momento presente) denota um desenvolvimento recente que é considerado como anormal ao dispensacionalismo clássico (tradicional), particularmente uma vez que esses dispensacionalistas também afirmam um aspecto de “já, ainda não” ao reino davídico de Jesus Cristo, que significa que o reinado do Senhor “já” foi inaugurado (uma vez que ele reina sobre o trono de Davi nos céus), embora o cumprimento completo do reino de Davi seja “ainda não”, uma vez que aguarda o futuro reino milenar; portanto, o trono do Pai e o trono de Davi são sinônimos.
Por toda a história do dispensacionalismo, tem havido um desenvolvimento sistemático desde os tempos de Darby. Os dispensacionalistas modernos continuam a desenvolver e a refinar o dispensacionalismo; entretanto, o dispensacionalismo progressivo permanece controvertido por introduzir mudanças fundamentais ao dispensacionalismo, à medida que os dispensacionalistas progressivos são vistos como tendo se separado do refinamento das visões dos dispensacionalistas anteriores e introduzindo uma revisão drástica. No início do século XX, o dispensacionalismo se tornou o mais popular sistema evangélico de teologia.

Conclusão

Os reformadores suportaram tão incrível perseguição por parte da Igreja Católica que foi natural que espiritualizassem as Escrituras e entendessem que o papa era o Anticristo (é, portanto, compreensível por que os reformadores desenvolveram suas conclusões!). Os reformadores abandonaram o método alegórico de interpretação (característico do catolicismo romano) em todas as áreas, exceto na escatologia. O amilenismo é o ponto de vista profético da Igreja Católica, e um milênio não literal foi também o ponto de vista profético dos reformadores protestantes. O motivo pelo qual muitos dos reformadores mantiveram o amilenismo do catolicismo foi a época em que eles viveram. Eles abraçaram, sim, uma interpretação gramático-histórica das Escrituras relativamente à soteriologia e à eclesiologia. Como a escatologia não era uma questão de importância maior durante a Reforma, os reformadores não tiveram a oportunidade de aplicar sua hermenêutica consistentemente; todavia, quando a aplicaram, esse fato levou ao reavivamento do pré-milenismo (que originalmente era apoiado extensivamente pela igreja primitiva). À medida que a igreja celebra o quingentésimo aniversário da Reforma, os crentes podem ser gratos pelo reavivamento que sobreveio em reafirmar o evangelho da graça por meio da fé somente em Cristo, e como a revitalização interpretativa levou à renovação do antigo pré-milenismo.

Notas

  1. Bernard Ramm, Protestant Biblical Interpretation: A Textbook of Hermeneutics, 3rd rev. ed. (1970; reimpresso, Grand Rapids: Baker, 1997) 51-52.
  2. Roy B. Zuck, Basic Bible Interpretation (Colorado Springs: Victor, 1991) 44.
  3. Theodore G. Tappert, ed. e trad., Luther’s Works, ed. geral Helmut T. Lehmann (Filadélfia: Fortress Press, 1967) 4:114-115.
  4. Marit Trelstad, “Scholasticism as Theological Method,” em Encyclopedia of Martin Luther and the Reformation, 2 vols., ed. Mark A. Lamport (Lanham, MD: Rowman & Littlefield, 2017) 2:694.
  5. Luther’s Works, 54:134.
  6. Ibid. 54:346.
  7. Ibid. 54:134.
  8. Richard G. Kyle, The Last Days Are Here Again (Grand Rapids: Baker, 1998) 61; Gordon H. Johnston, “Reformation Hermeneutics,” em Dictionary of Premillennial Theology, ed. geral Mal Couch (Grand Rapids: Kregel, 1996) 164.
  9. John Calvin, Commentary on First John [online] (Christian Classics Ethereal Library, acessado no dia 29 de junho de 2017) disponível em http://www.ccel.org/c/calvin/comment3/comm_vol45/htm/ v.iii.vi.htm.

Vou Deixar o Brasil...


Vou deixar o Brasil…

Daniel Lima
Em reportagem recente, a Folha de S.Paulo, com base em pesquisa realizada pelo Instituto Datafolha,[1] declarou que a maioria (62%) dos jovens brasileiros entre 15 e 25 anos gostaria de deixar o Brasil. Este desejo não é apenas um sonho, mas se traduz em um êxodo de brasileiros que é cada vez maior. O primeiro país escolhido é os Estados Unidos, em segundo lugar está Portugal, seguido de perto por outros países europeus ou Austrália e Nova Zelândia. Quanto mais formação e maior nível econômico, maior a vontade de deixar o Brasil.
A principal motivação para a partida é a desesperança quanto ao futuro, tanto do ponto de vista político como do econômico. Segundo alguns analistas, além da frustração com a realidade no Brasil, um dos fatores que motiva o desejo de mudança é a facilidade de realizá-la. Este é um dos motivos que faz de Portugal um dos principais destinos pretendidos. Outro fator que contribui é a própria acessibilidade a informações. Hoje é possível, pela internet, ver até mesmo as condições de moradia que estão sendo oferecidas. Outros analistas declaram que a maioria dos que partem retornam após alguns anos, embora não existam dados concretos a respeito deste fluxo.
Muitos de nós conhecemos alguém que já foi ou pelo menos gostaria muito de sair do Brasil. É natural que cada um de nós também considere se esta é uma opção para si mesmo. Sem dúvida a situação é difícil e as perspectivas não são promissoras. Mesmo em uma época de campanhas eleitorais, quando cada candidato deveria apresentar sua melhor proposta, o futuro apresentado não tem nos dado muita esperança.
Muitos de nós conhecemos alguém que já foi ou pelo menos gostaria muito de sair do Brasil.
É claro que não se pode encontrar erro em alguém que decide partir ou ficar. Mas esta não parece ser a questão central. O que preocupa neste quadro é: realmente não importa para o cristão ficar no Brasil ou deixá-lo? Uma questão paralela é onde está nossa esperança, mas disso trataremos em outro momento. Porém, e a questão de como, enquanto seguidores de Jesus, devemos encarar este êxodo de brasileiros, tanto com relação a outros como com relação a si mesmo? Qual o papel do cristão diante deste quadro?
Vamos alistar alguns argumentos e ao final levantar algumas perguntas que podem orientar um cristão nesta questão, que para muitos é uma possibilidade clara.

Cidadania

A primeira consideração ao pensar em deixar nosso país é nossa cidadania. Em Filipenses 3.20 o apóstolo Paulo, inspirado pelo Espírito Santo, declara: “A nossa cidadania, porém, está nos céus, de onde esperamos ansiosamente o Salvador, o Senhor Jesus Cristo”. Qualquer que fosse seu entendimento de cidadania, ele deixa claro que nossa prioridade é com o reino de Deus e não com nossos vínculos com a geopolítica terrena. Isso não evita, no entanto, que ele manifeste seu compromisso e preocupação com seus irmãos judeus. Em Romanos 9, nos versos de 2 a 4, ele escreve:
Tenho grande tristeza e constante angústia em meu coração. Pois eu até desejaria ser amaldiçoado e separado de Cristo por amor de meus irmãos, os de minha raça, o povo de Israel.
O autor de Hebreus também parece instruir que nossa origem terrena deve ter um aspecto secundário em nossas considerações (Hebreus 11.13-16):
Todos esses viveram pela fé e morreram sem receber o que tinha sido prometido; viram-no de longe e de longe o saudaram, reconhecendo que eram estrangeiros e peregrinos na terra. Os que assim falam mostram que estão buscando uma pátria. Se estivessem pensando naquela de onde saíram, teriam oportunidade de voltar. Em vez disso, esperavam eles uma pátria melhor, isto é, a pátria celestial.
Amor que tenha como objeto um ideal não é amor – é fantasia.
Parece evidente que cidadania geopolítica tem um papel no mínimo secundário na decisão de permanecer no Brasil ou deixá-lo. No entanto, ao olharmos o exemplo de Paulo acima, uma outra questão surge: somos chamados a amar pessoas, e pessoas específicas, não apenas um equivalente genérico. Este amor não existe fora de um contexto de tempo e lugar, ou seja, não podemos amar pessoas como conceito e não amar pessoas concretas. Amor que tenha como objeto um ideal não é amor – é fantasia. Além disso, um entendimento sóbrio da soberania de Deus nos leva a crer que o local, a família e o país em que nascemos não é obra do acaso, mas sim da intencionalidade divina. Isso por si só não nos torna cativos de nosso país de origem, mas deve nos levar a considerar esta origem enquanto buscamos cumprir o projeto de Deus para nossa vida.

Motivação

Uma outra consideração fundamental para um cristão decidir se deve mudar de país é sua motivação. Não só é natural, como também esperado, que busquemos as melhores condições para nós mesmos e para aqueles que amamos. No entanto, ainda assim nos cabe perguntar o que é melhor? Esta pode parecer uma pergunta tola, pois, à primeira vista, todos sabemos o que é melhor. Todavia, o cristão tem um ponto de referência diferente quando busca definir o que é uma vida melhor. As palavras de Jesus ao final da famosa passagem de Mateus 6 são muito importantes:
Portanto, não se preocupem, dizendo: “Que vamos comer?” ou “Que vamos beber?” ou “Que vamos vestir?” Pois os pagãos é que correm atrás dessas coisas; mas o Pai celestial sabe que vocês precisam delas. Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas a vocês. (versos 31-33)
Sem sombra de dúvida todos, inclusive os cristãos, podem e devem buscar as melhores condições de vida. Mas este não é nosso princípio fundamental, não é nossa referência maior ao decidirmos. Nossa prioridade deve ser o reino de Deus e a sua justiça.

Compromissos

Um terceiro conceito a ser considerado é compromissos. O conceito de compromisso está profundamente desgastado em nossos tempos. Certamente uma das razões para isso é que o mesmo foi usado por muito tempo como ferramenta de manipulação por líderes e governantes. No entanto, é também inegável que a definição de ser adulto inclui a tomada de decisões a partir de valores que superam nossas preferências ou desejos. Em 1Timóteo 5.4 Paulo destaca que certos compromissos agradam a Deus:
Mas, se uma viúva tem filhos ou netos, que estes aprendam primeiramente a pôr a sua religião em prática, cuidando de sua própria família e retribuindo o bem recebido de seus pais e avós, pois isso agrada a Deus.

Exemplos Bíblicos

Dentre os vários exemplos bíblicos que podemos examinar sobre pessoas que deixaram sua nação e seu povo, vamos examinar dois. O primeiro deles é Abraão. Gênesis 12.1 registra com muita clareza a ordem de Deus para que Abraão deixasse seu país: “Saia da sua terra, do meio dos seus parentes e da casa de seu pai, e vá para a terra que eu lhe mostrarei”. Porém, é curioso que, uma vez na terra prometida, Deus confirmou (Gênesis 12.7) que aquela seria a terra dada à sua descendência. Em seguida (verso 10), diante da fome naquela terra, Abraão deixa a terra prometida e vai ao Egito, que era na época uma das maiores potências dos pontos de vista econômico e cultural. Em outras palavras, diante de uma situação de crise, Abraão deixou sua terra por “melhores condições”. No entanto, chegando no Egito, quando confrontado com uma situação ameaçadora, ele se acovarda e, deixando um compromisso com sua esposa, acaba por permitir que o faraó leve Sara para seu harém. Pensando que esta era irmã de Abraão, o faraó lhe dá gado, riquezas, servos e servas. Entre estes estava uma jovem egípcia de nome Hagar que traria tanta dor à família de Abraão. Assim, o primeiro deixar de seu povo foi ordenado por Deus e trouxe benção, já o deixar de sua terra para fugir de um tempo de crise trouxe situações danosas, riquezas e também muita dor a Abraão.
O segundo exemplo foi quando Davi, fugindo de Saul, decide se aliar aos filisteus. O capítulo 26 de 1Samuel registra a segunda vez que Davi poupa a vida de Saul. Curiosamente, no primeiro verso do capítulo 27 encontramos uma conclusão de Davi que, frente aos acontecimentos recentes e às promessas de Deus, era surpreendente: “Algum dia serei morto por Saul. É melhor fugir para a terra dos filisteus. Então Saul desistirá de procurar-me por todo o Israel, e escaparei dele”. Deus havia prometido cuidar de Davi, que havia sido ungido rei sobre Israel. Davi estava andando em plena obediência a Deus... por que então este pensamento de deixar sua terra? A única conclusão é que devido aos anos de fuga, cansaço e injustiças Davi tomou uma decisão errada, buscando refúgio longe dos planos de Deus. O resultado a princípio foi agradável, mas logo se tornou um problema para Davi, que começou a mentir para encobrir seus atos. A situação piora ainda mais quando as famílias de seus homens são raptadas e estes pensam em se rebelar contra ele. Deus, no entanto, estava justamente trazendo a libertação que Davi havia cansado de esperar, removendo Saul e abrindo espaço para o reinado de Davi.
Com base nesta e em outras histórias, gostaria de alistar algumas perguntas que todo cristão deveria fazer ao pensar em deixar ou permanecer em seu país:
  1. Já tomei uma decisão de seguir a Jesus em qualquer circunstância? Já decidi me alinhar ao seu projeto para minha vida?
  2. Acredito que Deus tem um plano para minha vida e que este plano inclui o lugar e o contexto onde vou viver, trabalhar e me relacionar?
  3. Onde vou servir melhor a Deus?
  4. Onde poderei cuidar melhor da vida espiritual pessoal e da minha família?
  5. Estou pensando em sair em obediência à direção de Deus ou estou meramente fugindo de tempos difíceis?
  6. Estou sensível à direção do Espírito Santo quanto aos meus planos?
  7. Qual igreja ou grupo de cristãos será minha comunidade de apoio no local para onde estou indo?
  8. Existe algum compromisso ou tarefa aqui que é minha responsabilidade?
  9. É este o momento certo para esta mudança em minha vida?
  10. Como Deus será exaltado com esta mudança em minha vida?
Minha sincera oração é que você, eu e cada cristão tome decisões que afetam sua vida debaixo de uma perspectiva de nosso compromisso de servir e honrar o Senhor. Que possamos afirmar juntamente com o apóstolo Paulo:
Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim. (Gálatas 2.20)
  1. https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2018/06/se-pudessem-62-dos-jovens-brasileiros-iriam-embora-do-pais.shtml