Desde o segundo século depois de Cristo, muitos de dentro da Igreja
têm afirmado que ela substituiu Israel para sempre. Na metade do
segundo século, Justino Mártir, em seu famoso Dialogue with Trypho, a Jew
[Diálogo com Trifão, um Judeu], chamou a Igreja de “a verdadeira raça
israelita”, com base em que “Cristo é Israel”. Justino continua:
Tais são as palavras das Escrituras; portanto, entendam que a semente de Jacó agora se refere a algo mais, e não como se pode supor, que fale sobre o seu povo. Pois não é possível que a semente de Jacó, ou que Deus tenha aceitado aquelas mesmas pessoas a quem Ele reprovara como sendo inadequadas para a herança, e que prometa essa mesma herança a elas novamente.[1]
Passou apenas uma geração depois do encerramento do cânon do Novo
Testamento, e já nasceu a horrível teologia de que Israel foi para
sempre substituído pela Igreja. Ainda mais perturbador para nós,
atualmente, é o fato de que essa teologia não apenas sobrevive em
nossos dias, mas está em alta nos meios evangélicos que costumavam ser
sempre isentos de tais visões.
As Promessas Sobre a Terra Para Israel
Por todo o Antigo Testamento, começando em Gênesis, o Senhor fez
promessa após promessa a Abraão, Isaque, Jacó e a seus descendentes de
que a terra de Israel pertence ao povo judeu. A promessa é repetida
cerca de vinte vezes no livro de Gênesis.[2] O livro de Deuteronômio
fala pelo menos vinte e cinco vezes que a terra é um presente do Senhor
ao povo de Israel (Dt 1.20,25; 2.29; 3.20; 4.40; 5.16; etc.). Walter
Kaiser, estudioso do Antigo Testamento, observa: “sessenta e nove vezes
o escritor de Deuteronômio repetiu a promessa de que Israel um dia
‘possuiria’ e ‘herdaria’ a terra que lhe fora prometida”.[3] Os Salmos,
o livro de adoração ao Senhor, freqüentemente levam o adorador a
ações de graça ao Senhor por Suas promessas de aliança e por Sua
fidelidade. Por exemplo, o Senhor declara: “Pois o Senhor escolheu a
Sião, preferiu-a por sua morada: Este é para sempre o lugar do meu
repouso; aqui habitarei, pois o preferi” (Sl 132.13-14).
Por todo o Antigo Testamento, os profetas mostram promessa após
promessa desse tempo de restauração futura daquela terra (Is 11.1-9;
12.1-3; 27.12-13; 35.1-10; 43.1-8; 60.18-21; 66.20-22; Jr 16.14-16;
30.10-18; 31.31-37; 32.37-40; Ez 11.17-21; 28.25-26; 34.11-16;
37.21-25; 39.25-29; Os 1.10-11; 3.4-5; Jl 3.17-21; Am 9.11-15; Mq
4.4-7; Sf 3.14-20; Zc 8.4-8;10.11-15). Mesmo assim, a despeito da
abundância de declarações tão claras no Antigo Testamento, muitos nos
saguões acadêmicos da Igreja dizem que Deus deserdou Seu povo no Novo
Testamento.
Falando sobre as promessas da terra a Israel, o estudioso britânico
N. T. Wright é típico da mentalidade que vem da academia em nossos
dias. Ele diz:
As tentativas modernas de reavivar esse nacionalismo geográfico, e dar a ele um colorido “cristão”, provocam a seguinte e muito importante reflexão teológica: a tentativa de “transportar” algumas das promessas do Antigo Testamento sobre Jerusalém, a Terra, ou o Templo, para que seu cumprimento ocorra em nossos dias tem o mesmo formato teológico que a tentativa do catolicismo da pré-Reforma de achar que Cristo estava sendo recrucificado em cada missa. (...) Se a ira de Deus, sobre a qual Jesus e Paulo falaram realmente tivesse terminado com os horríveis eventos do ano 70 d.C., a única atitude adequada das gerações subseqüentes acerca dos judeus, do Templo, da Terra de Jerusalém deveria ser de pesar ou de dó. Nesse ponto, o “Sionismo Cristão” é o equivalente geográfico de um, por assim dizer, apartheid “cristão”, e deveria ser rejeitado como tal.[4]
Wright segue adiante dizendo que todas essas promessas do Antigo
Testamento não devem ser entendidas literalmente, mas são, de certa
forma, cumpridas não-literalmente através da primeira vinda de Jesus e
da formação do corpo global de Cristo. Ele afirma:
...a leitura completa do Novo Testamento sobre as promessas, de acordo com as quais, como disse Paulo, todas se tornaram realidade no Messias (2 Co 1.20). Isso não é simples “espiritualização”. Em vez disso, essas promessas, vistas através das lentes da cruz e da ressurreição, foram, em certo sentido, afuniladas por um lado, e, por outro lado, foram ampliadas para incluir toda a ordem criada.[5]
Walter Kaiser propôs a seguinte resposta ao sofisma filosófico de Wright:
Há pelo menos cinco erros fatais no pensamento daqueles que apóiam a tese da Teologia da Substituição: (1) A “Nova Aliança” foi feita com a casa de Israel e de Judá. Deus nunca fez uma aliança formal com a Igreja; (2) O fracasso dos judeus, assim como o fracasso da Igreja, estava calculado no plano de Deus (Rm 11.8); (3) O Novo Testamento ensina claramente que Deus não rejeitou o Israel desobediente (Rm 11.25-26), pois eles são os ramos naturais nos quais a Igreja foi enxertada; (4) O aspecto “eterno” da promessa sobre aquela terra não deve ser igualado ao aspecto “eterno” do sacerdócio arônico (1 Cr 23.13) ou aos descendentes de Recabe (Jr 35.19); e (5) A alegoria de Paulo sobre os gálatas (Gl 4.21-31) não ensina que o Israel nacional foi substituído pela Igreja; ela ensina que a busca pela justificação pela fé e pela graça leva à liberdade e à salvação.[6]
Gary Burge, professor na Wheaton College, é um eco americano do
sentimento de Wright sobre este assunto quando, após citar Karl Barth,
diz:
Portanto, o Novo Testamento coloca em Cristo todas as expectativas antes mantidas para “o Sinai e Sião, Betel e Jerusalém”. Para um cristão, retornar a uma territorialidade judaica é negar fundamentalmente o que transpareceu na encarnação. É desviar a devoção adequada do novo lugar onde Deus reside, isto é, do Filho. Isso explica por que o Novo Testamento aplica à pessoa de Cristo a linguagem religiosa anteriormente dedicada à Terra Santa ou ao Templo. Ele é a nova espacialidade, o novo local onde Deus pode ser encontrado.[7]
Respondendo a Tamanho Absurdo
Tais “teólogos” constroem absurdos totais a partir de um fundamento
de pensamento puramente abstrato que não tem apoio nem no Antigo nem
no Novo Testamento. Como diz o Pregador em Eclesiastes: “Vaidade das vaidades. Tudo é vaidade e correr atrás do vento” (Ec 1.2; 2.17).
Conheço algumas pessoas que diriam simplesmente que tudo isso é apenas
bazófia. As realizações de Cristo em Sua primeira vinda são a base
sobre a qual Israel herdará suas promessas físicas, não uma base sobre a
qual devem-se negar suas futuras bênçãos.
O apóstolo Paulo responde a tais absurdos em Romanos 11, quando faz a seguinte pergunta: “Pergunto,
pois: terá Deus, porventura, rejeitado o seu povo? De modo nenhum!
(...) Deus não rejeitou o seu povo, a quem de antemão conheceu” (Rm
11.1-2). Adiante, Paulo diz: “Pergunto, pois: porventura, tropeçaram para que caíssem? De modo nenhum!” (Rm 11.11).
Esses “teólogos” estão dizendo coisas que não se encontram na
Bíblia. Onde é que o Novo Testamento ensina que Israel foi deserdado de
sua terra? Por que o Novo Testamento não menciona isso? O Novo
Testamento não o menciona porque isso nunca aconteceu. Por essa razão
eles tentam engendrar meras abstrações, produtos de vãs imaginações,
porque não há nenhuma passagem que ensine esse deserdar das promessas
da terra a Israel.
O sionismo e o sionismo cristão têm sido instrumentos usados por
Deus na história para fazer a bola de neve rolar ladeira abaixo e agora
ela já não pode mais ser impedida.
Quando pensamos sobre a reunião e o restabelecimento mundiais, sem
precedentes, da nação de Israel, deveríamos imediatamente fazer as
seguintes perguntas: “Por que Deus traria o povo judeu de volta à sua
terra natal, restabelecê-lo-ia como nação, se ele não tivesse qualquer
futuro naquela terra? Por que Apocalipse 12 fala de Israel naquela
terra durante a Tribulação? Por que Paulo fala da corrupção do Templo
de Deus pelo homem da iniqüidade em 2 Tessalonicenses 2 se não haverá
uma reconstrução do Templo em Jerusalém?”.
O Templo ocupará seu espaço em Jerusalém. Por que Jesus retornará a
Jerusalém em Sua segunda vinda se está correto que a OLP esteja no
comando daquele pedaço de chão? Por que haverá 144.000 testemunhas
judias, 12.000 de cada uma das doze tribos de Israel, se os judeus
foram removidos da terra? E o que dizer das duas testemunhas que
ministrarão em Jerusalém durante quarenta e dois meses ou três anos e
meio?
Deus não rejeitou – e não rejeitará – Seu povo. Israel é
verdadeiramente o “supersinal” de Deus sobre o final dos tempos. Israel
é o estopim do barril de pólvora para o conflito mundial final. E, ao
mesmo tempo, em quase dois mil anos, o estopim está começando a entrar
em combustão. O sionismo e o sionismo cristão têm sido instrumentos
usados por Deus na história para fazer a bola de neve rolar ladeira
abaixo e agora ela já não pode mais ser impedida. Parece que, a cada
dia que passa, Israel e as nações se tornam mais alinhadas no rumo que
tomarão durante a iminente Tribulação. Mesmo assim, muitos se tornaram
cegos pelo chamado “entendimento espiritual” do Novo Testamento.
Eventos maravilhosos e terríveis estão por vir! Maranata! (Thomas Ice - Pre-Trib Perspectives - http://www.chamada.com.br)
Notas:
Notas:
- Justin Martyr, Dialogue of Justin, Philosopher and Martyr, with Trypho, A Jew [Diálogo de Justino, Filósofo e Mártir, com Trifão, um Judeu] capítulo 135, parágrafo 1.
- Observe as seguintes referências em Gênesis: 12.1-3,7-9; 13.14-18; 15.1-18; 17.1-27; 22.15-19; 26.2-6,24-25; 27.28-29,38-40; 28.1-4,10-22; 31.3,11-13; 32.22-32; 35.9-15; 48.3-4,10-20; 49.1-28; 50.23-25.
- Walter C. Kaiser, Jr., Toward an Old Testament Theology [Em Direção a uma Teologia do Antigo Testamento] (Grand Rapids: Zondervan, 1978), pp. 124-25.
- N. T. “Tom” Wright, “Jerusalem in the New Testament” [Jerusalém no Novo Testamento], in P. W. I. Walker, editor, Jerusalem, Past and Present in the Purpose of God [Jerusalém, Passado e Presente no Propósito de Deus] (Grand Rapids: Baker Book House, 1994), pp. 73-75.
- Wright, “Jerusalem in the New Testament” [Jerusalém no Novo Testamento], p. 73.
- Walter C. Kaiser, Jr., “An Assessment of ’Replacement Theology”’ [Uma Avaliação da Teologia da Substituição] Mishkan: A Forum on the Gospel and the Jewish People [Mishkan: Um Fórum sobre o Evangelho e o Povo Judeu] (Fevereiro 1994; No. 21), p. 10.
- Gary M. Burge, Jesus and the Land: The New Testament Challenge to “Holy Land” Theology [Jesus e a Terra: O Desafio do Novo Testamento à Teologia da Terra Santa”] (Grand Rapids: Baker Academic, 2010), pp. 129-30.