domingo, 24 de janeiro de 2021

Mateus


O Evangelho de Mateus

A sucessão ao trono geralmente traz muitas incertezas e conflitos. Absalão, filho de Davi, tentou usurpar o trono de seu pai (2 Samuel 15.1; 18.18). Uma escolha errada feita pelo sucessor de Salomão, Roboão, ao trono fez com que este perdesse metade de seu reino para um traidor (1 Reis 12.20). Manaém assassinou seu predecessor em Israel (2 Reis 15.14). Ser rei era um negócio muito perigoso. E não foi diferente nem mesmo para o Rei dos reis, Herdeiro legítimo ao trono de Deus.

 Se já houve alguma vez uma sucessão tão conturbada, com certeza foi essa. Um homem [chamado Jesus] afirmou ser o Messias de Israel, e é claro que toda a nação quis tirar isso a limpo. E, obviamente, Ele teve de apresentar suas credenciais. Quem deseja ter em seu meio um impostor? Assim, o livro de Mateus aponta as credenciais de Jesus, apresentando-o como Rei, mas o Rei de um reino muito diferente — o Reino dos céus.

O Evangelho de Mateus tem muitas características judaicas. Por exemplo, o termo Reino dos céus aparece 31 vezes, e o termo Reino de Deus, cinco vezes. Nenhum outro Evangelho dá tanta ênfase ao Reino. A esperança da restauração do glorioso reino de Davi era algo que ardia no coração dos judeus naqueles dias. E Mateus nos mostra claramente que essa esperança estava em Jesus ao usar nove vezes em seu Evangelho o título da realeza judaica Filho de Davi. Além disso, Mateus chama Jerusalém de Cidade Santa (Mateus 4-5; 27.53) e a cidade do grande Rei (Mateus 5.35), duas formas exclusivamente judaicas de referir-se a ela.

Os judeus do primeiro século davam muita importância à justiça, e Mateus usa as palavras justo e justiça mais do que são usadas nos Evangelhos de Marcos, Lucas e João juntos. Mateus também trata de assuntos como a Lei, a pureza cerimonial, o Sábado, o templo, Davi, o Messias, o cumprimento das profecias do Antigo Testamento e Moisés — tudo isso de um ponto de vista judaico. Ele faz mais de 53 citações do Antigo Testamento e mais de 70 referências às Escrituras hebraicas.

Seu livro enfatiza 33 vezes que as obras de Jesus foram um cumprimento das profecias do Antigo Testamento. A genealogia no capítulo 1 é puramente judaica e descreve a descendência de Jesus de Abraão, o patriarca do povo judeu, até Davi. Além disso, Mateus menciona em seu Evangelho os governantes de Israel da época (Mateus 2.1,22; 14.1) e alguns costumes, como lavar as mãos (Mateus 15.2), sem explicá-los, indicando que seus leitores eram, em sua maioria, judeus já familiarizados com essas práticas. O Evangelho de Mateus vai muito além de apresentar uma mera biografia de Jesus. Um de seus objetivos é provar ao povo judeu que Jesus é o Messias, o Rei que havia sido prometido.

A genealogia no capítulo 1 aponta para Cristo como o herdeiro do Reino eterno que Deus prometeu a Davi. Ao citar um salmo messiânico, em Mateus 22.41-44, Jesus demonstrou de modo bem claro aos judeus que Ele é o Herdeiro do trono de Davi. Embora muitos judeus da época de Jesus fossem “cegos” demais para reconhecer quem Ele realmente era, os gentios (como os três sábios) reconheceram-no como o Rei prometido a Israel quando Ele era um bebê. Enfim, a acusação pregada na cruz acima da cabeça de Jesus destacava nitidamente Sua realeza: este é Jesus, o Rei dos judeus (Mateus 27.37).

No entanto, o mais importante no Evangelho de Mateus é que este documento prova a legítima autoridade de Jesus ao destacar Seus ensinamentos e Sua vida de retidão (Mateus 7.28,29). Outro objetivo do Evangelho de Mateus é descrever as características do Reino de Deus, tanto em relação a Israel quanto à Igreja. Os judeus ortodoxos sempre zombavam de todos os que afirmavam que Jesus era o Messias e ainda mais dos que declaravam que Ele era o seu Rei. Eles diziam: “Se Jesus é Rei, onde está a restauração do reino de Israel que foi prometida?” Muitos judeus nos dias de Jesus o rejeitaram como Messias, embora tanto Ele como João Batista tenham pregado que o Reino dos céus estava próximo (Mateus 3.2; 4.17; 10.7).

A rejeição de Jesus pelos judeus é o tema principal de Mateus (Mateus 11.12-24; 12.28-45; 21.33; 22.14). Por causa dessa rejeição, Deus adiou o cumprimento de Suas promessas a Israel e, por conseguinte, estendeu Suas bênçãos aos gentios. Mateus é o único dos Evangelhos que fala especificamente da Igreja (Mateus 16.18; 18.17), mostrando aos gentios como a Eclésia é formada e descrevendo vários episódios em que gentios demonstraram fé em Jesus: os magos, o centurião e a mulher cananeia.

Mateus deixou registradas a profecia de Jesus de que o evangelho seria pregado a todas as nações (Mateus 24.14) e a Grande Comissão, segundo a qual os apóstolos deveriam fazer discípulos em todas as nações (Mateus 28.19). O ensinamento de Jesus mostrava que as bênçãos do Reino de Deus seriam estendidas aos gentios. No entanto, um dia, Israel seria restaurado e receberia todas as bênçãos prometidas (Romanos 11.25-27; 15.8,9). O objetivo final de Mateus é instruir a Igreja. Uma pista muito clara disso está na Grande C o ­ missão, dada por Jesus: Ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo. Ensinando-as a guardar todas as coisas que eu vos tenha mandado (Mateus 28.19,20).

O processo de discipulado implica aprender e aplicar os ensinamentos de Jesus, e o Evangelho de Mateus enfatiza os principais discursos do Mestre, entre os quais: o Sermão do Monte (Mateus 5.1— 7.28); o comissionamento dos 12 apóstolos (Mateus 10.5— 11.1); a parábola do semeador, a do joio e do trigo, a do tesouro escondido e a da pérola de grande valor (Mateus 13.3-53); o maior no Reino dos céus, a importância do perdão, ilustrada pela parábola do credor incompassivo (Mateus 18.2— 19.1); o sermão profético sobre o fim dos tempos (Mateus 24.4— 26.1).

Em vez de empreender uma narrativa sobre a vida de Jesus, como faz Marcos, Mateus usa os 10 Mateus elementos da narrativa em seu Evangelho como pano de fundo dos sermões de Jesus. Este Evangelho não traz o nome de seu autor, mas deixa-nos pistas. Seu autor conhecia a geografia da Palestina muito bem (Mateus 2.1; 8.5; 20.29; 26.6). Ele estava familiarizado com a história dos judeus, seus costumes, suas ideias e as classes sociais (Mateus 1.18,19; 2.1; 14.1; 26.3; 27.2). Ele também conhecia muito bem o Antigo Testamento (Mateus 1.2-16,22,23; 2.6; 4-14-16; 12.17-21; 13.35; 21.4; 27.9). E a terminologia do livro sugere que seu autor era um judeu da Palestina (Mateus 2.20; 4.5; 5.35; 10.6; 15.24; 17.14-27; 18.17; 27.53).

 Os detalhes apontam de modo bem específico Mateus, o discípulo de Jesus, como o escritor desse Evangelho. Por ser coletor de impostos, Mateus era culto e entendia muito bem de contabilidade. Não é surpresa alguma, portanto, que este Evangelho contenha mais referências ao dinheiro do que todos os outros. Além disso, a cidade natal de Mateus era Cafarnaum, a qual, quando citada, vem sempre acompanhada de alguma explicação, como: cidade marítima, nos confins de Zebulom e Naftali (Mateus 4.13); que te ergues até aos céus (Mateus 11.23). Mateus escreveu seu Evangelho antes da destruição de Jerusalém em 70 d.C. Ele descreve Jerusalém em seu livro como a Cidade Santa, pois ela ainda estava intacta (Mateus 4.5; 27.53), e menciona os costumes judaicos que permaneciam até o dia de hoje (Mateus 27.8; 28.15). Além disso, a profecia de Jesus sobre a destruição de Jerusalém (descrita em Mateus 24.2) não traz indício algum de que já tinha sido cumprida quando Mateus registrou as palavras de Jesus. A luz de tudo isso, podemos concluir que o livro foi escrito entre 50 e 60 d.C.

 

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