terça-feira, 12 de março de 2019

Justamente um Jumento


Justamente um jumento

Wolfgang Schuler
O jumento caracteriza-se por ser um animal paciente mas também teimoso, e, como tal, ele desempenha um papel de destaque na Bíblia. Nas bênçãos que Jacó profere sobre os seus filhos, ele é amarrado ao “ramo mais seleto” da videira.
As bênçãos que Jacó profere ao fim da sua vida sobre os seus filhos são familiares para todos nós, especialmente as declarações proféticas sobre o seu filho Judá (Gn 49.8-12), que culminam nas palavras: “O cetro não se apartará de Judá, nem o bastão de comando de seus descendentes, até que venha aquele a quem ele pertence, e a ele as nações obedecerão”.
A tribo de Judá perdeu o cetro e o bastão de comando no ano 6 d.C., quando, sob o imperador romano Tibério e o governador Pôncio Pilatos, a Judeia foi oficialmente declarada província romana. Pouco depois, Jesus de Nazaré reivindicou no templo pela primeira vez, aos 12 anos de idade, ser o Messias, para espanto dos seus pais e mais ainda dos escribas e fariseus: “Não sabiam que eu devia estar na casa de meu Pai?” (Lc 2.49).
No entanto, qual seria o papel do jumento na bênção de Jacó nos versículos subsequentes? “Ele amarrará seu jumento a uma videira; e o seu jumentinho, ao ramo mais seleto; lavará no vinho as suas roupas; no sangue das uvas, as suas vestimentas. Seus olhos serão mais escuros que o vinho; seus dentes, mais brancos que o leite” (Gn 49.11-12). O que significará isso? É raro algum intérprete ocupar-se desses belos, porém misteriosos versículos.
Sandra Oster Barras, gerente do escritório israelense da Christian Friends of Israeli Communities (CFOIC) no centro das terras bíblicas e no coração de Israel, as regiões “ocupadas” da Judeia e da Samaria, trata detalhadamente da bênção de Jacó em seu estudo bíblico de cinco partes em DVD The Choosing of a Chosen People (A Escolha de um Povo Escolhido), mas também ela omite a passagem que fala do jumento. Em um diálogo pessoal, ela admitiu que alguns intérpretes também atribuem um sentido messiânico a essa passagem.
Chama atenção que o jumento ocupa uma posição de destaque nas Escrituras Sagradas. Apenas um grupo restrito de animais é aceito para uso nos sacrifícios. São aqueles que (tal como o Messias) se submetem docilmente às mãos do homem, mesmo quando este pretende sacrificá-los, ou seja, matá-los: bovinos, carneiros, cabras e pombos mansos. O jumento é expressamente excluído desse grupo. Todo primogênito de jumento pertencia a Deus e precisava ser resgatado por meio de um cordeiro; caso contrário, teria de ser morto (literalmente “desnucado”) – uma palavra muito violenta (Êx 13.13). Balaão ouve as palavras proféticas de Deus justamente da boca de um jumento, o que salvou sua vida e lhe deu mais tarde a oportunidade – ainda que a contragosto – de proferir algumas das mais extraordinárias profecias sobre o povo de Israel e o seu Messias (Nm 23–24).
A montaria real de Davi era um jumento, sobre o qual ele introduziu seu filho Salomão em Jerusalém para apresentá-lo como seu sucessor de direito em sua velhice. Zacarias anunciou o Messias como alguém que, como Davi, entra em Jerusalém montado num jumento, filhote de uma jumenta (Zc 9.9), e é exatamente isso que Jesus faz sob os hosanas do Seu povo pouco antes de celebrar Sua última Páscoa. Muitos jumentos possuem em seu lombo uma grande e escura cruz no pelo – uma longa faixa longitudinal e outra mais curta, transversal, na altura das patas dianteiras.

Muitos jumentos possuem em seu lombo uma grande e escura cruz no pelo.
Os jumentos eram apreciados por sua docilidade e paciência, mas eles também conseguem ser bem teimosos. Deus repetidamente confirma Seu amor e Sua eterna fidelidade a Israel apesar de todos os desvios e da obstinação desse povo. A Escritura Sagrada refere-se no mínimo nove vezes à obstinação de Israel.
Pode ser que o jumento não fosse aceitável como animal sacrificável por ser tão semelhante a Israel, o “primogênito” que Deus não quer sacrificar, mas resgatar por meio do Cordeiro. Seria por isso também que a primeira cria do jumento deveria ser resgatada por um cordeiro? Seria que Judá deveria amarrar o seu “jumento” – sua própria “cabeça dura” – à mais nobre das videiras (Jo 15.1; o Texto afirma: Ele fará!) para não fugir dela e não perder a bênção que lhe foi designada?
Suas vestes serão lavadas pelo “sangue das uvas” daquela videira, prossegue o versículo 11 de Gênesis 49. Um tanto à margem, ele também constata que o suco dessa nobre videira parece ser excelente. Os olhos “escuros“ revelam que ele bebeu abundantemente desse suco. A única referência bíblica além desta em que aparece a palavra hebraica que significa “escuro” ou “avermelhado“ é Provérbios 23.29-30, que trata do abuso do consumo de vinho. Nessa passagem, a melhor tradução seria algo como “inebriado de vinho”.
Com isso proporciona-se a Judá não só uma purificação externa, mas também interna, e o seu coração se enche de alegria como por um bom vinho. Os olhos inebriados (não avermelhados) refletem isso, e os dentes brilhantemente brancos (“mais brancos que o leite”) são um sinal exterior de que essa purificação interna se realizou.
Assim, essas palavras proféticas de Jacó interpretam de forma simpática, até bem-humorada, aquilo que mais tarde Ezequiel anunciaria detalhadamente (Ez 36.25-28) e o que Paulo confirma em Romanos 11.26 a respeito do povo judeu, fazendo referência a Isaías 59.20: “Virá de Sião o redentor que desviará de Jacó a impiedade”. Ele cita Isaías de acordo com a Septuaginta, que se desvia aqui do texto massorético em dois pontos. Como a Septuaginta é mais antiga que o texto massorético redigido, ela parece ser mais confiável. E Deus se mantém fiel à Sua Palavra!

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